Os comerciantes do centro histórico de Vila Real dizem estar a lutar pela sobrevivência neste ano atípico por causa da pandemia de covid-19 que provocou enormes quebras no negócio e afastou os clientes das ruas da cidade.
Com a sapataria aberta há 52 anos na rua Direita, no centro histórico da cidade, Almiro Loureiro, com 83 anos, recordou os tempos em que chegou a vender “100 pares de sapatos por dia”, em que todas as lojas estavam ocupadas e as pessoas eram tantas que havia dificuldades em passar naquela artéria.
“Agora, há dias inteiros em que não vendo nenhum sapato. Não se vê ninguém na rua nem nas lojas. Esta é uma rua quase deserta e está quase tudo abandonado. Não há alegria e nem temos com quem conversar”, afirmou à agência Lusa.
A pandemia de covid-19 veio agravar as dificuldades já sentidas pelos comerciantes desta área da cidade. Com a reabertura após o confinamento o negócio recuperou um pouco, “mas nada que compense”, salientou Almiro Loureiro.
O Natal costuma ser uma boa época para os comerciantes, mas este ano a apreensão parece ser geral a todos.
“Em anos anteriores, por esta altura, já se vendiam coisas para o Natal, mas neste momento ainda nem sabemos se vamos estar abertos”, referiu Almiro Loureiro.
A iluminação natalícia está a ser colocada nas artérias da cidade, mas foram canceladas outras iniciativas, como a animação de rua ou a festa de passagem de ano.
A Câmara anunciou que vai canalizar parte do orçamento do programa de Natal para apoiar o comércio local, através de um concurso de montras, e distribuir embalagens de alumínio para o serviço de ‘take-away’ dos restaurante.
Sónia Fortuna tem uma loja de brinquedos e apontou quebras no comércio na ordem dos 50% em 2020.
Mostrou-se preocupada, mas ao mesmo tempo esperançada com a época que se aproxima. “Vamos ver como corre”, frisou.
A comerciante elencou dificuldades a nível do estacionamento nesta zona da cidade, onde também decorrem várias obras em simultâneo e frisou que “há muito menos gente na rua”.
Queixou-se ainda da falta de apoios para os pequenos comerciantes, dizendo que vai participar no concurso de montras anunciado pela câmara, que vai atribuir 100 euros a cada participante e depois um prémio de 500 euros ao vencedor.
Mais à frente, Emídio Nogueira está em frente à loja de roupa que possui há 65 anos e comenta que as “coisas estão muito mal”.
“Não se vende nada, não se ganha nem para a luz nem para a água. Tenho que aguentar porque tenho que vender alguma coisa para pagar a quem devo”, frisou este comerciante de 78 anos.
Do outro lado do acrílico que colocou no balcão, Alice Gonçalves descreve uma rua deserta, “clientes completamente desaparecidos” e outros que passaram a vir apenas “uma vez por semana”.
Na loja vende revistas, jornais, peluches e lembranças, como canecas, postais ou ímanes.
No mês de agosto, contou, ainda apareceram alguns turistas que, nas sua maioria, compraram mapas.
Em anos anteriores, esta seria uma altura em que já estava a “vender muito bem”, mas Alice Gonçalves confessa que sente que os comerciantes estão a ficar “desmoralizados”.
“O ano é atípico. Com a chegada dos emigrantes, o verão nem foi muito mau, as coisas compuseram-se. Após isso é o que se vê, caímos novamente no marasmo, à espera do que não vem”, afirmou João Brás, proprietário de uma ourivesaria.
Segundo explicou, o segundo semestre dos ano “é sempre a safa dos comerciantes por causa do verão e do Natal”.
“Este ano ainda não sabemos o que o Natal vai ser. Para já está tudo muito parado. Este mês tenho 16 dias a zero, o que é inédito”, afirmou, apontando o receio com que se enfrenta esta crise provocada pela covid-19.
Urbano Miranda, presidente da Associação Comercial e Industrial de Vila Real (ACIVR), disse à Lusa que, de uma forma geral, “as coisas estão más” e que “toda a gente está a tentar lutar pela sobrevivência” com “a esperança” de que, passando esta fase, “se consiga voltar a uma certa normalidade”.
“Estamos permanentemente a ser bombardeados com limitação à atividade e dificilmente se consegue ver uma luz ao fundo do túnel, mesmo com as notícias sobre as vacinas”, referiu.
Este responsável disse ser “injusto” pedir às empresas que suportem à sua custa uma parte das medidas confinamento para combater a pandemia.
Questionado sobre as críticas de alguma inércia apontadas à ACIVR, Urbano Miranda refutou e disse que se trata de “problemas de caráter politico” e que a associação tenta “estar presente na discussão política relativamente às medidas de apoio” e “reivindicar o sentimento coletivo de toda a classe”.
“Não há nenhuma associação sozinha que tenha voz suficiente para se fazer ouvir”, frisou, referindo ainda que as medidas anunciadas pelo município foram definidas em conjunto com a ACIVR.
Foto: AP