A situação aflitiva em que se encontra a Casa do Douro (CD), o organismo representativo dos 40 mil viticultores durienses, não deverá ter solução com o actual Governo. Confrontado pelo JN, o Ministério da Agricultura, que tem sido, ao longo dos anos, o interlocutor privilegiado daquela instituição, diz «nada ter a ver com a Casa do Douro».

Por seu turno, o Ministério das Finanças (avalista, em nome do Estado, de uma dívida de 85 milhões de euros da CD), entende que \"o ministério que tutela a Casa do Douro é o Ministério da Agricultura\".

A posição oficial dos dois ministérios é apenas mais um exemplo do mal-estar que, há pelo menos 16 anos, está instalado entre governos e CD. Em tempos gestora de um orçamento anual de 150 milhões de euros, a instituição duriense mergulhou numa profunda crise quando, entre 1989 e 1991, teve que se endividar fortemente para comprar aos produtores dezenas de milhares de pipas de vinho produzidas em excesso. O garrote apertou-se ainda mais a partir de 1990, altura em que a CD entrou no capital da Real Companhia Velha. Acresce que, nas reformas feitas pelo Governo em 1995 e 2003, foram retiradas à instituição uma série de competências que, até aí, não só se mantinham como uma importante fonte de receitas como permitiam a intervenção da CD no mercado.

Desconfianças

A história dos últimos 16 anos é feita de evidentes desconfianças entre as partes (Governo, CD e exportadores de vinhos do Porto) e de inúmeras tentativas falhadas para se encontrar uma solução. De quem é, afinal, a culpa?

Vários intervenientes que, com maior ou menor protagonismo, tiveram de lidar com o processo ao longo do tempo apontaram, todos sob anonimato, a liderança da instituição como uma das principais fontes de conflito. Há os que sugerem a mudança imediata dos dirigentes, mas há também quem defenda simplesmente a extinção do organismo duriense.

Os mais moderados entendem que a CD é um organismo fundamental, enquanto estrutura representativa de 40 mil viticultores, e, como tal, deve existir, mas questionam se será legítimo uma instituição estar sempre a culpar os governos pelos problemas que a afectam. Uma das principais reivindicações da CD prende-se com o não pagamento de indemnizações por parte do Estado em compensação pela perda de poderes decretada em 1995 e 2003. Quem assim pensa argumenta com os benefícios e avales que o Estado tem proporcionado, sem que se consiga o equilíbrio das contas.

Extinção?

Já os menos moderados sugerem que a Casa do Douro, tal como hoje existe, não tem viabilidade. Os defensores desta ideia propõem que o organismo evolua para uma forma mais moderna de estar no mercado. Exemplo a criação de uma união organizada dos produtores para fazerem a comercialização conjunta dos seus produtos, à semelhança do que aconteceu no sector do leite, com a criação da Lactogal, hoje o maior operador ibérico no seu género.

A alternativa seria, segundo outros intervenientes, simplesmente decretar o fim do organismo. Embora reconheçam o peso histórico e político da instituição, admitem que, se nada for feito antes, o tempo encarregar-se-á de, naturalmente, impor a mudança - isto é, a falência. Sem conseguir receita suficiente para fazer frente ao montante das dívidas e sem capacidade para evoluir para outro tipo de organização, a CD terá de ser encerrada, argumentam, com a inevitável ida dos trabalhadores para o desemprego e a venda do património, cuja receita reverteria para a liquidação dos encargos perante os credores.

Na recentes deslocação à Régua, a propósito das comemorações dos 250 anos da criação da Região Demarcada Douro, no discurso que fez no salão nobre da Casa do Douro, o primeiro-ministro, José Sócrates, entusiasmou os durienses não apenas com os projectos apresentados, mas também por ter referido que, apontadas as soluções, \"resta salvar o Douro\". Falta saber se é possível salvar o Douro sem salvar a Casa do Douro.

Governo diz \"nada ter a ver\"

com a Casa do Douro

Vitral simboliza entendimento

Quem entra na sede da Casa do Douro, na Régua, é surpreendido por um enorme vitral que domina todo o átrio. Datado de 1945, é uma obra de Lino António. O maior dos painéis (o central, na foto, à direita) mostra três figuras. A do meio, feminina, simboliza a República a outorgar os estatutos da Casa do Douro (criada em 18 de Novembro de 1932). No lado esquerdo, está presente uma outra figura feminina, representado a Lavoura (os produtores), tendo a seu lado uma enxada de bicos. Do lado esquerdo, a figura é masculina e representa o Comércio. Sob o patrocínio de Santa Marta, padroeira do Douro, as duas figuras que ladeiam a República apertam a mão direita, símbolo do acordo e da cooperação entre as duas profissões. A história encarregar-se-ia de mostrar que o entendimento ali selado haveria de ser quebrado muitas vezes. Infelizmente para a região do Douro.



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