Na aldeia de Vale de Salgueiro, no concelho de Mirandela, a tradição voltou a cumprir-se, com uma forma bem original de assinalar o dia de Reis, também chamada Festa dos Rapazes, em honra de Santo Estêvão. Inclusivamente, os rapazes têm permissão para, durante os dois dias de festa, fumarem os cigarros que lhes apetecer.

Todos os anos, é escolhido alguém da localidade para protagonizar a figura do rei, que tem a seu cargo a organização da festa e que traz consigo uma coroa revestida a veludo e adornada de objectos em ouro - avaliado em cerca de 15 mil euros - emprestados pelos habitantes, como símbolo de riqueza e poder.

Tal como manda a tradição, a festa durou dois dias. Na noite de anteontem, Vítor Vidinha - o rei - percorreu todas as habitações da aldeia, sempre com o grupo de gaiteiros a acompanhar, distribuindo cerca de 300 quilos de tremoços e 100 litros de vinho, em cabaças tradicionais.

O rei não escondia a satisfação em ser o protagonista desta festa, confessando que \"é uma alegria enorme sentir que continuo a contribuir para que esta bonita tradição não acabe e verificar que as pessoas da nossa terra também colaboram para preservar um evento que já faz parte da nossa identidade cultural.\"

Entretanto, no centro da aldeia, prepara-se o baile e, quando o rei chega, as pessoas são convidadas a dançar a murinheira, típica dos celtas, ao som das gaitas de foles e dos bombos..

Também nessa noite, dezenas de crianças andaram pela rua com maços de tabaco, comprados pelos familiares, e têm permissão dos próprios pais para fumar, \"mas só durante dois dias, porque a tradição não pode morrer, mas, depois, até damos conselhos para que não fiquem com o vício\", faz questão de referir Rosa de Jesus, habitante de Vale de Salgueiro e avó do pequeno Eduardo Hermenegildo, de apenas cinco anos de idade, que se deliciava a devorar os cigarros.

No segundo dia, ontem, a alvorada aconteceu às sete da manhã. O rei, ao som das gaitas de foles e dos bombos, voltou a percorrer toda a aldeia para receber a \"manda\", ou seja, os donativos para custear os cerca de 2 mil euros de despesa que a festa tem.

\"Nunca deixo de dar alguma coisinha, porque o meu filho já foi o rei há três anos e sei bem que esta festa já fica cara\", disse, ao JN, depois de entregar um envelope ao rei com a sua comparticipação.

Vítor Vidinha seguia o seu caminho, distribuindo beijos e abraços pelos habitantes que esperavam à porta de casa, com o dinheiro na mão preparado para ajudar a pagar a festa.

Não se sabe a origem

Ninguém sabe ao certo quando começou a tradição da festa de Vale do Salgueiro, nem as razões que levaram à sua realização desta forma. Os mais velhos dizem apenas que \"isto já é assim desde há muitos anos, vem do tempo dos nossos avós\", afirma um idoso da aldeia transmontana, já com 82 anos, acrescentando que, \"na minha infância, já havia esta tradição de fumar cigarros, que custavam cinco tostões\".

No entanto, sempre há alguns que contam histórias que tudo terá começado no tempo dos reis. \"Alguém tirou a coroa, deixou-a no altar da igreja e acabou por morrer de imediato. Então, o povo achou que a coroa devia ser colocada sempre em alguém, para afastar os maus espíritos\", conta outro habitante da aldeia.

Ontem, a festa terminou com a celebração da missa, ocasião aproveitada para colocar a coroa noutro habitante da aldeia, que terá a responsabilidade de organizar a festa de 2008. O escolhido foi Miguel Cunha, que já prometeu \"uma festa de arromba, para que a tradição nunca termine\". FP



PARTILHAR:

Explosão na salamandra

Esgotou o vinho embalado