O escultor Óscar Rodrigues, de Vila Pouca de Aguiar, distribuiu hoje 3.230 euros angariados no leilão de uma escultura da sua autoria por sete famílias, vítimas dos incêndios que em junho afetaram a região.

Os donativos recolhidos na iniciativa solidária "Anjos sem Asas", por Pedrógão Grande, foram hoje entregues pelo escultor, que se deslocou de Vila Pouca de Aguiar, no distrito de Vila Real, para entregar pessoalmente as verbas a cada uma das sete famílias que selecionou de entre uma lista oficiosa a que teve acesso.

Além dos envelopes em numerário que variam entre os 400, 500 e os 600 euros, que entregou em mão a duas famílias de Pobrais, duas de Vila Facaia e três de Castanheira de Pera, a escultura que esteve na base desta ação solidária, foi doada aos Bombeiros de Vila Pouca de Aguiar e irá ficar no novo quartel.

A iniciativa "Anjos sem Asas" contou com a colaboração de cerca de duas dezenas de pessoas, entre os quais o próprio escultor, sendo que a escultura em madeira, feita de um eucalipto, representa um bombeiro com asas de anjo e demorou 12 dias a fazer.

"Esta escultura foi feita em homenagem aos bombeiros e a todos aqueles que morreram no incêndio. Venho entregar [o donativo] em numerário porque quero saber que o dinheiro chega às pessoas", explicou Óscar Rodrigues à agência Lusa.

O escultor diz que decidiu avançar com esta iniciativa depois de ver as primeiras imagens "aterradoras" nos noticiários portugueses.

"Decidi fazê-lo sobretudo pela imagem que ainda tenho gravadas. Foi tão severo e tão áspero ver as imagens no noticiário. Tinha chegado da Suíça, estava de férias em Vila Pouca de Aguiar. A primeira imagem que me lembro parecia um cenário de apocalipse", relembrou.

Como escultor, tem perto do seu ateliê, no Soutelinho do Mesio, sua terra natal, matéria-prima, madeira: "Vim à varanda e olhei para um tronco de eucalipto que tinha ali. Chamou-me a atenção, não só por ser imponente, mas pela simbologia que está associada, o eucalipto, que foi sobretudo eucaliptal e pinhal que ardeu na zona".

Óscar Rodrigues decidiu então leiloar a escultura em frações, (botas, os capacetes, o machado, entre outros) junto dos seus conterrâneos.

"Uma vez que a peça representa os bombeiros, "os anjos sem asas", decidi homenageá-los, não só na escultura, mas na oferta da escultura ao novo quartel dos Bombeiros de Vila Pouca de Aguiar. As pessoas contribuíram sabendo que a escultura iria ser doada aos bombeiros locais", frisou.

Em Pobrais, o primeiro contemplado pela ajuda solidária de Óscar Rodrigues foi Armando Inácio.

Com os olhos lavados em lágrimas, explicou que perdeu uma casa de primeira habitação: "Sobrou o cão e dez pintos. Gerou-se o pânico na aldeia. Não fiquei lá [na estrada da morte] porque a Nossa Senhora de Fátima fez um milagre".

Armando Inácio foi um dos habitantes de Pobrais que em pânico fugiu para a estrada, na companhia de um vizinho e os pais.

Viu os carros a arder, mas conseguiram inverter a marcha e voltar para um local onde já só havia fumo.

Ao receber o envelope das mãos de Óscar Rodrigues disse que nunca pensou que que no nosso país houvesse gente tão generosa.

"A sua atitude [escultor] não há dinheiro nenhum que a pague", desabafou.

Já o escultor, depois de um abraço sentido entre ambos, afirmou: "Não há dinheiro nenhum que pague as palavras que recebo das pessoas".

Óscar Rodrigues diz-se "triste", sobretudo, com as instituições de solidariedade social.

"Estas entidades existem para isso [solidariedade]. Deviam estar à cabeça da ajuda. Se já têm os levantamentos feitos e têm a seu cargo a ajuda de milhões que todos contribuíram, as pessoas não podem esperar. Precisam de liquidez. Terá sentido, não haver ajuda imediata?", questiona.
Foto: Ana Sofia



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