A azinheira sobre a qual tantas vezes Miguel Torga escreveu foi o palco de uma homenagem prestada ao escritor, no passado dia 17. O director da companhia de teatro Filandorra, David Carvalho, leu alguns poemas do escritor junto a esta árvore, que secou logo a seguir à sua morte. A homenagem prosseguiu ao redor da casa que o viu nascer e para a qual ia quando visitava a sua terra. De seguida, a comitiva de 40 pessoas, da qual não constava nenhum membro da família do escritor, seguiu para o cemitério local, onde este se encontra sepultado. Ali, alguns admiradores de Miguel Torga depositaram flores e leram poemas seus.
O padre Avelino, até há pouco tempo pároco de São Martinho de Anta e amigo do escritor, teceu algumas críticas a esta iniciativa. Segundo ele, Miguel Torga \"merecia outro tipo de homenagem\". O padre defende que se deveria ter aproveitado a data da sua morte para \"falar e discutir as suas obras\". No entanto, a homenagem \"limitou-se à leitura de alguns poemas, a uma romagem ao cemitério e a um porto de honra\".
O pároco relembrou que \"Miguel Torga vivia amargurado por não ser compreendido\" e \"ficava triste quando lhe teciam críticas negativas\". No entanto, disse também, o escritor \"acreditava que um dia viria a ser reconhecido pelas suas obras\". Perante as críticas que lhe eram feitas, Miguel Torga terá dito: \"Tolero, mas um dia eles me dirão\".
Conhecendo \"bem\" o escritor, o Padre Avelino explicou que \"existiam nele duas pessoas distintas\". A primeira era Adolfo Correia da Rocha, o homem. A segunda era Miguel Torga, \"um homem novo que apareceu para dar vida a uma vida que pretendia, ligada à literatura\". Seria também com esta literatura, com as obras que escreveu, que, segundo o pároco, \"pretendia renovar a sociedade\". No entanto, receava que as suas obras fossem mal interpretadas e, por diversas vezes, dizia aos seus amigos, como confessou o Padre Avelino, \"quem me quiser conhecer que me leia, mas que me entenda\". Também por isso, o pároco gostaria que no dia de aniversário da morte do escritor se tivesse caminhado pelos lugares que Miguel Torga tanto apreciava e sobre os quais escrevia, como por exemplo a Senhora da Azinheira, a quem o escritor chamava Senhora do Amparo, e que dizia ser o seu \"gabinete de trabalho\". O padre Avelino gostaria também que se falasse simplesmente sobre Miguel Torga, \"o homem, o escritor, o médico\".