A Associação de Jovens Agricultores do Douro e Trás-os-Montes (AJADTM) está a ser investigada por suspeitas de irregularidades no decorrer de cursos de formação profissional promovidos por esta entidade.
A denúncia partiu de uma carta anónima, que acusa a presidente da Associação de Jovens Agricultores do Douro e Trás-os-Montes (AJADTM), Ana Leandro, de ter exercido a actividade de formadora em quatro cursos promovidos por esta entidade, sendo as folhas de sumários, segundo a missiva, assinadas por outros formadores. Em troca das assinaturas, lê-se também, Ana Leandro, como presidente da associação, assumiria \"o compromisso de lhes assegurar formação regular, ao longo do ano\".
Segundo a legislação em vigor, \"não é admitida a prestação de serviços remunerados, no âmbito de pedidos de financiamento, por parte de membros dos órgãos sociais de organizações de agricultores ou de trabalhadores ou de outro tipo de associações, enquanto entidades titulares de pedidos ou entidades beneficiárias da formação\". Ou seja, Ana Leandro não poderia ser, como presidente da AJADTM, formadora dos referidos cursos, financiados através do programa Agro. Sendo assim, se a dirigente tiver dado realmente formação, isso constituirá uma ilegalidade. E se outras pessoas assinaram os referidos sumários das aulas, dadas, segundo a carta, por Ana Leandro, então sê-lo-á duplamente.
No entanto, a carta anónima não se limitou a fazer acusações. Também mencionou os cursos onde estes factos teriam supostamente ocorrido e as datas da sua realização. Além disso, enunciou os nomes e os contactos de \"um conjunto de colegas formandos\" que, conforme ali se expressa, \"testemunham o exposto\". E, contactados pelo Semanário TRANSMONTANO, vários alunos confirmaram, realmente, a presença de Ana Leandro como formadora, assegurando que lhes tinha dado aulas. \"Deu pouco tempo, mas deu, de certeza absoluta\", afirmou uma das pessoas contactadas. Outro formando garantiu que, num curso com a duração aproximada de duas semanas, Ana Leandro terá dado \"praticamente metade\" da formação.
Os cursos em causa são os de poda em verde, poda de Inverno, higiene e segurança no trabalho agrícola e compotas e geleias, ou seja, quatro dos sete que a AJADTM levou a cabo durante o ano de 2002. Todos eles decorreram no último semestre do ano passado, na Quinta do Planalto, sede da associação, situada no concelho de Alfândega da Fé.
Irregularidades desconhecidas
As associações e as acções de formação profissional por elas desenvolvidas são regularmente acompanhadas e fiscalizadas, precisamente para verificar a conformidade dos processos, procurando evitar irregularidades. Neste caso, essa tarefa cabe à Câmara de Agricultura do Norte (CAN), que, por isso, tem em seu poder uma cópia dos registos da formação.
Confrontada com as acusações que pendem sobre Ana Leandro e a associação a que ela preside, a CAN informou o Semanário TRANSMONTANO de que \"nas visitas de acompanhamento efectuadas pela Unidade Técnica da Câmara de Agricultura do Norte ao projecto que a AJADTM promoveu durante o ano 2002, não foi em nenhuma situação verificada a presença da engenheira Ana Leandro como formadora, em nenhuma das acções de formação que integram tal projecto\". Além disso, a CAN acrescenta que, \"da análise dos documentos que integram o referido projecto, em nenhuma situação se verificou que a engenheira Ana Leandro tenha intervido como formadora, não havendo qualquer sumário assinado pela referida técnica\". Explicações que contradizem o testemunho dos alunos contactados.
Investigação em curso
A carta anónima enviada ao Semanário TRANSMONTANO foi também remetida, segundo o seu autor, para o gestor do programa Agro, de onde proveio o financiamento para a realização das referidas acções de formação.
O gestor do programa, Tito Rosa, confirmou ao Semanário TRANSONTANO ter conhecimento desta carta e das denúncias que ela contém. E afirmou que tanto os cursos aí mencionados como todos os outros que, até à data, foram promovidos pela AJADTM estão a ser alvo de uma auditoria externa que o Gabinete de Gestão do Programa, integrado no Ministério da Agricultura, solicitou à CAN. Além desta investigação, da qual o Gabinete aguarda o resultado, Tito Rosa disse também que foram cancelados os pagamentos relativos a acções de formação a levar a cabo pela associação transmontana. Ou seja, o plano de formação da AJADTM para 2003, que ronda os 150 mil euros (30 mil contos), está suspenso, até que toda esta situação esteja esclarecida. No final, caso se conclua que as denúncias feitas na carta correspondem à verdade, Tito Rosa não têm dúvidas em afirmar que será desencadeado um processo para responsabilizar os intervenientes nas irregularidades que possam ter existido. E que o dinheiro recebido através do programa de formação também terá que ser devolvido.
\"Tranquilidade\" na AJADTM
Confrontada com este cenário, a presidente da AJADTM, Ana Leandro, disse ao Semanário TRANSMONTANO que encara a situação com \"tranquilidade\". A dirigente refutou a acusação de que foi formadora nos referidos cursos, assumindo que esteve presente em acções de formação e falou com os alunos, mas, salientou, \"sempre na qualidade de presidente da associação\", para \"acompanhar o funcionamento dos cursos, saber se estava tudo a correr bem\". Ana Leandro garante que o fez na presença dos formadores e adianta que o seu objectivo, além de \"defender os interesses dos associados\", foi \"transmitir a sua experiência como agricultora\".
Quanto à auditoria de que a AJADTM está a ser alvo, a engenheira disse ter conhecimento da deslocação dos técnicos à associa-ção, \"há cerca de quinze dias\", mas afirmou que pensava tratar-se de \"uma operação normal, de rotina, para verificar se estava tudo em ordem, como já é hábito fazer-se\". A dirigente diz também que ainda não foi questionada sobre o assunto. E quanto à suspensão dos pagamentos ordenados pelo Gabinete de Gestão do Programa Agro, Ana Leandro respondeu não saber de nada. \"Não fui informada de qualquer suspensão ou cancelamento das verbas, por isso, e uma vez que já há contratos assinados entre os organismos intervenientes, tenho a convicção de que o programa para 2003 vai arrancar dentro da data prevista\", afirmou.
Contudo, a presidente da AJADTM fez questão de lamentar o facto de a denúncia ser anónima. \"Os cobardes que me acusam deviam fazê-lo na minha cara e não nas minhas costas\", disse Ana Leandro, que acredita estar perante uma caso de \"ataque ao poder\" para lhe tirarem o lugar, lugar esse que diz pÎr à disposição assim que acabar este mandato.
Recorde-se que existem divergências no seio da AJADTM e que Ana Leandro foi acusada por dois ex-vice presidentes de os ter substituído de forma ilegal (ver edição número 410 do Semanário TRANSMONTANO, de 17 de Março).