"Enquadrada", pelo director da Escola Superior de Educação, Luís Cardoso, "no trabalho de estágio que a aluna Cláudia está a fazer na Escola Preparatória de Mirandela", a presença da pintora Graça Morais, trouxe ao auditório grande afluência de público, constituído não só por alunos e professores, mas também por outras pessoas, que não quiseram deixar perder a oportunidade de ver e ouvir a artista plástica.

A apresentação da sua obra foi feita através de um documentário em vídeo, intitulado "Na cabeça de uma mulher está a história de uma aldeia", rodado quase na totalidade no Vieiro, a sua terra natal, pertencente ao concelho de Vila Flor. As imagens repetem, no entanto, alternadamente, passagens do percurso de caminho de ferro entre a estação do Tua e a sua terra, feito pela pintora, procurando recuperar uma memória de determinado período da sua vida, quando o tempo corria ao ritmo do comboio.

A aldeia de Vieiro, porém, é o centro sobre o qual roda todo a história dos seus quadros. O primeiro, representando dois homens a segurar o toldo da azeitona, merece-lhe o comentário de que é uma das cenas que têm a ver com a sua memória: a compenetração e a forma como os lavradores levam a sério a sua tarefa, tão nobre como qualquer outra, embora sem a compensação, que certamente mereceria. "Faço parte deste lugar, que é uma espécie de sentir as raízes, como esta oliveira", revela. O trabalho do campo, apesar de difícil, desperta-lhe um afecto tão grande, que o elo a que deu origem se tornou "tão grande como essa relação".

Veio para a sua terra, em 1982, sendo através dela que vê o mundo. E não admira, tal é o "encontro de culturas", que ali observa: o contacto dos que nunca saíram da terra e nunca viram o mar com os que foram para o Brasil, para Angola e Moçambique e já regressaram, de vez, e os que foram para a França, Alemanha e outros países da Europa e vêm à aldeia de férias no Verão.

Para a criação de alguns dos seus quadros recorre muitas vezes às memórias da sua "infância privilegiada". A religiosidade das pessoas da aldeia, o cheiro enjoativo da cera das velas, misturado com o do sebo que os homens aplicavam nas botas quando iam à missa, à capela da sua terra, as cores dos véus e das roupas pretas das mulheres, sempre submissas, que deitavam luto pela morte dos familiares mais próximos, mas que guardavam e reflectiam sempre o seu poder maternal, tudo isso faz parte do imaginário que reproduz nas telas.

Com nove anos já dizia à mãe que queria ser pintora, sujeita embora a ouvir dela que "os pintores morrem de fome". Mas a resposta estava logo na ponta da língua: "Não interessa, mas é isso que eu quero ser". O seu sentido de liberdade vem desse tempo, em que a porta da sua casa estava sempre escancarada. O espaço de brincadeira começava em casa e prolongava-se pelos campos. A natureza, os ciclos da terra, a forma desta gente viver são a torrente das imagens que cria. Apesar de tudo, tem dúvidas quando pinta e sofre com isso. Mesmo cheia de dúvidas está feliz no seu atelier, considerando esse momento de grande verdade consigo própria.

No período de debate que se seguiu, a pintora respondeu a algumas questões referindo que "a pintura não é nada de reprodução". Lamentou que apesar do IP4, ainda não se vejam aqui exposições de arte. Aproveitando a presença do presidente da Câmara de Vila Flor, anunciou a existência de um projecto de Sisa Vieira, que se propõe recuperar um imóvel, na vila, destinado a um Centro de Arte, que poderá proporcionar, não só exposições suas , mas também a de outros pintores.



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