A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) instaurou um processo contraordenacional ao Centro Hospitalar de Trás-os-Montes por violação da lei que gere os tempos de espera para cirurgia, no caso de um doente com cancro que morreu sem ser operado.
Numa deliberação datada de 22 junho, dada hoje a conhecer, a ERS conclui que na resposta aquele utente, considerado prioritário, houve um “período temporal que se mostra manifestamente excessivo e potencialmente nocivo para a saúde e bem-estar do utente”.
“O Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD) endereça, em primeiro lugar, uma palavra de conforto e solidariedade à família do utente. Em seguida, informa que se encontra a analisar internamente todo o processo”, reagiu hoje aquela unidade hospitalar, depois de uma notícia do Correio da Manhã a dar conta que o paciente não resistiu aos seis meses de espera de uma cirurgia considerada urgente.
A deliberação da ERS explica que o doente em causa foi inscrito na Lista de Inscritos para Cirurgia (LIC) a 21 de abril de 2021, referenciado como Nível 2 – Prioritário, pelo que “o Tempo Máximo de Resposta Garantido (TMRG) aplicável era de 45 dias, pelo que se estendia até ao dia o5 de junho de 2021, mas o paciente morre a 03 de setembro de 2021 sem ter ido ao bloco operatório".
A 23 de maio foi emitido um Vale Cirurgia para que o doente fosse operado noutra unidade hospitalar, que foi aceite pela Santa Casa da Misericórdia de Felgueiras – Hospital Santo Agostinho a 07 de junho de 2021.
Mas, a 22 de junho, o Hospital Santo Agostinho devolveu o caso ao CHTMAD com o fundamente de “falta de condições acessórias” para dar resposta: “O que significa que demorou seis dias contados da data da receção do processo clínico do utente para tomar diligências no processo (…) hiato particularmente crítico do ponto de vista da tempestividade da prestação de cuidados de que o utente necessitava”, considerou a ERS.
A 23 de junho de 2021, o utente foi readmitido em Trás-os-Montes, “sendo que, a essa data, o TMRG para a cirurgia (dia 05 de junho de 2021) estava há muito ultrapassado”, tendo sido dada ao utente uma nova previsão para a cirurgia o dia 15 de julho de 2021, que foi cancelada.
“Por outro lado, entre a data de readmissão do utente [no CHTMAD] (23 de junho de 2021) e a nova data para cirurgia (15 de julho de 2021), decorreram 22 dias, período temporal que se mostra manifestamente excessivo e potencialmente nocivo para a saúde e bem-estar do utente, sobretudo tratando-se de paciente oncológico inscrito em LIC com nível Prioritário”, considerou a ERS.
Um novo Vale Cirurgia foi emitido, a 16 julho, mas entretanto, em data que a ERS não conseguiu precisar, foi “explicada a situação […] ao doente, filha e neta e a não indicação para realização de cirurgia”.
Além da instauração de um procedimento contraordenacional por “violação de regras estabelecidas em lei ou regulamentação que visam garantir e conformar o acesso dos utentes aos cuidados de saúde”, como é a que regula o funcionamento dos TMRG, a ERS instruiu o CHTMAD a “garantir, em permanência, que, na prestação de cuidados de saúde, são respeitados os direitos e interesses legítimos dos utentes, nomeadamente, aos cuidados adequados e tecnicamente mais corretos, os quais devem ser prestados (…) com prontidão e num período de tempo clinicamente aceitável”.
A ERS insta também aquela unidade hospitalar a assegurar que na Proposta Cirúrgica “seja mencionada o facto de a cirurgia em causa carecer de necessidades de suporte perioperatório ou de algum tipo de serviço ou cuidado específico”.
Ao Hospital Santo Agostinho, a ERS emitiu “uma instrução no sentido de sempre que, no âmbito de um Vale de Cirurgia, verificar que, por motivo fundamentado, não pode realizar determinada cirurgia, proceder imediatamente à sua devolução ao Hospital de Origem, por forma a agilizar a tramitação do episódio clínico do utente”.