Um investigador da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) propôs-se desvendar "o mistério” da configuração dos edifícios do santuário rupestre de Panóias, em Vila Real, e já encontrou pedras semelhantes em igrejas e num caminho.
David Freire-Lista, doutorado em geologia e engenharia geológica, trabalha com cientistas de Espanha e França e disse, citado num comunicado divulgado hoje pela UTAD, que a configuração original dos edifícios que compunham o santuário “é um mistério" que, juntamente com a sua equipa de investigação, pretende desvendar nos próximos anos.
Classificado como monumento nacional desde 1910, o Santuário de Panóias foi construído na transição do século II para o século III pelo senador romano Caius Calpurnius Rufinus e foi dedicado às divindades infernais.
Está localizado em Vale de Nogueiras, concelho de Vila Real, é composto por três templos erigidos sobre fragas imponentes e possui cavidades de diversas dimensões onde tinham lugar os rituais e celebrações.
Convicto de que “as pedras falam e contam histórias dos tempos e das pessoas que viram passar, tornando-se parte da sua memória”, David Freire-Lista propôs-se procurar o destino que, ao longo dos séculos, levaram os silhares retirados do Santuário de Panóias.
Silhar é o nome que se dá à pedra usada, por exemplo, em obras de alvenaria ou para revestimento de paredes.
“Atualmente, encontra-se localizada uma pedreira histórica na zona do santuário e uma grande quantidade de blocos que faziam parte do santuário foram extraídos desta pedreira histórica e agora estão perdidos”, referiu o investigador.
David Freire-Lista acrescentou que, “uma vez que este santuário deixou de ter função ritual, passou a ser utilizado como pedreira, e os vizinhos pegaram nos blocos de pedra que formavam as paredes dos prédios do santuário para reaproveitá-los em construções como casas e cercas”.
No entanto, o investigador defendeu que as pedras utilizadas no património edificado “são únicas e irrepetíveis, sendo possível conhecer alguns dos seus destinos”.
“Os canteiros artesanais deram aos blocos dimensões e acabamentos únicos, definidos pelo próprio artesão que esculpiu a peça. Cada golpe do entalhe ou martelo foi gravado na superfície do elemento de pedra”, salientou, explicando que, através de técnicas de conservação de património, como o ‘scaneamento’ a laser 3D, é “possível estudar e reproduzir os diferentes acabamentos superficiais que canteiros históricos deram às suas peças.”
De acordo com o especialista, hoje "é possível identificar a microrrugosidade dos silhares, ou seja, identificar o acabamento que cada pedreiro deu às suas peças e estudar os parâmetros de rugosidade para identificar quais os blocos que pertenceram ao santuário”, referiu.
Nesse sentido, referiu, “foram identificados silhares com características semelhantes preservadas nas imediações da igreja de São Pedro de Vale de Nogueiras, bem como na igreja de São Tiago de Folhadela, concretamente na fachada norte”.
Nesta igreja, especificou, os “silhares apresentam ainda um orifício central retangular que terá servido para introduzir as tenazes de uma grua de rodas utilizada pelos romanos.”
O especialista disse ainda que foi localizado um caminho em Folhadela com escombros de casas de Vale de Nogueiras, onde se podem observar “blocos soterrados que poderão também ter vindo originalmente do Santuário de Panóias”.
No entanto, advertiu que “a demolição de edifícios e casas históricas juntamente com o reboco das fachadas com cimento a partir do século XX torna mais difícil localizar todos os blocos que outrora enobreceram um santuário único na Península Ibérica”.
16 dez 2022