Talvez o astuto dirigente não se tenha feito entender muito bem, ou, talvez, não tenha querido ofender aqueles que ao longo dos anos se vão juntando alegremente numa sala com a bandeira e quadros de jogadores benfiquistas na parede, comungando alegrias e tristezas, mais as últimas do que as primeiras de há nove anos a esta parte, claro está.
Mais entusiasmado pelo cenário colorido e eufórico da festa de Fall River estava, porém, Manoel Barbosa, director das Casas do Benfica, que num discurso apaixonado e ao qual se pode adicionar uma enormíssima dose de clubite aguda, dizia às tantas que o Benfica era o clube com maior número de filiais no mundo inteiro, mencionando até que nem o Manchester United e Barcelona se podiam dar ao luxo de ver tantas casas com o seu emblema por esse Mundo fora.
O que Manoel Barbosa se esqueceu de mencionar foi que nem ingleses nem espanhóis estão minimamente preocupados com esse folclore multicolor fora de portas, a não ser que isso significasse compra de camsiolas (não confudir com T-shirts) ou outras relíquias do clube que se traduzissem em dólares. Por acaso até mencionou os dois clubes mais ricos do mundo, autênticas máquinas de fazer dinheirinho, coisa que o Benfica, não obstante os apregoados 6 milhões e tantos adeptos, não consegue fazer.
Já uma vez aqui foquei este mesmo assunto, dizendo então que as Casas do Benfica, aqui, nos Açores, no Canadá, em Trás-os-Montes e na Conchichina não são mais do que os tais pequenos pontos de encontro, não advindo dessa febre clubista qualquer benefício palpável para o clube mãe.
Quando falo em benefício falo de dinheiro. Tão simples como isso, o Benfica precisa tirar partido da sua popularidade e os benfiquistas têm que aprender a compreender que folclore e música são uma coisa, produção e participação são outra completamente diferente.

Com ainda pouco tempo de Benfica, Luís Filipe Vieira cedo descobriu que o clube de Lisboa pode ter no estrangeiro uma excelente fonte de receita, não só em termos de captação de sócios “vivos”, como até de investidores de pequena e grande envergadura. Quando refiro sócios “vivos”, quero apenas dizer que há que acabar de uma vez por todas com o chamado sócio correspondente, transformando-o, com custos reais, em sócio do Benfica, o tal chamado sócio efectivo. Um sócio com um cartão igualzinho a qualquer outro, com as mesmas regalias e os mesmos deveres.
Mas, atenção, esse sócio não tem necessariamente que ser filiado em Casas do Benfica de Fall River, New Bedford, Cranston, Cambridge, Hamilton ou Toronto.
Para se ter uma ideia de como a coisa funciona, não estarei longe da verdade e realidade dos factos se disser que só em Fall River existem mais de 5 mil benfiquistas. A Casa do Benfica desta cidade, não obstante as suas excelentes instalações, e com um elenco directivo sólido e honesto, tem cerca de 200 sócios pagantes (24 dólares por ano) e desses só cerca de uma dúzia e meia são sócios correspondents do Benfica. Estes são números reais de Fall River e estou pronto a apostar, qualquer valor, que o mesmo se passa nas outras cidades e vilas deste imenso continente, para não falar de uma Europa também ela com cartazes vermelhos por tudo quanto é canto.
Ora, muito bem!
Como pode então tirar o Benfica partido deste seu universo estrangeiro?
Luís Filipe Vieira já adiantou ideias, já apalpou terreno e teve o cuidado de falar com gente que percebe da matéria. Aliás, o plano e ideias daquele que passa por ser agora a grande esperança benfiquista assenta bem nas ideias de
um benfiquista de Fall River, o industrial João Moniz, que no tempo da candidaturade Luís Tadeu, o tal que perdeu (maldita sorte – para os benfiquistas, claro!…) as eleições para Vale e Azevedo, se ofereceu para montar escritório nesta cidade, com escritório e secretária em regime de part-time. Esse escritório funcionaria como apoio directo ao clube de Lisboa, aonde os benfiquistas poderiam dirigir-se, fazer consultas, pagar as suas quotas, indagar sobre projectos, investimentos, etc, etc.
Impossível de realização?
Nada é impossível deste que haja um projecto válido e gente credível à frente do mesmo. Evidente se torna que Fall River funcionaria como centro desta cidade e outras vizinhas, com o exempo a ser seguido noutros centros de maior população encarnada.
Mas Filipe Vieira tem outros projectos para os mais endinheirados e também aí parece ter razão.
A criação de um núcleo de investidores no estrangeiro não é descabida e tenho conhecimento de alguns que estão dispostos a investir, desde que o projecto seja limpo, válido, sério e com garantias, se não garantias de lucros imediatos ou a longo prazo, no mínimo a garantia de que em caso de rotura financeira poderaim receber parte importante desse seu investimento.
Com riscos, evidentemente, sabendo-se, como se sabe, que o Benfica dos nossos dias é mesmo uma instância de alto risco.
A questão de fundo, agora, é saber em quê e em quem acreditar. As antepenúltima e penúltima apostas dos sócios benfiquistas tiveram efeitos catastróficos para o clube da Luz, já que tanto Manuel Damásio e Vale e Azevedo puseram o clube de pantanas. "Operações ao coração”, apostas em vinhos vinagreiros, contratos televisivos com adiantamentos até ao ano 2050 e tal, apostas incrivelmente erradas e dispendiosas em jogadores e treinadores que se vieram a revelar incapazes de dar a volta por cima, tudo isto levou o Benfica a uma situação altamente deficitária da qual agora se ressente.
Usando as palavras de um actual dirigente benfiquista, o Benfica não tem aonde cair morto!
Os dados agora lançados pelo actual elenco directivo benfiquista parecem, felizmente, bem diferentes. Manuel Vilarinho tem-se revelado um presidente cauteloso e Luís Filipe Vieira tem astúcia e inteligência para dar e vender.
Ambos falharam em termos de resultados imediatos da equipa de futebol, mas ambos dão a cara e continuam a apostar forte em duas frentes importantes:
devolver ao clube a credibilidade de outrora e dotá-lo de estruturas viradas a um futuro mais exigente e mais competitivo. Daí, a aposta noutro modelo de gestão e na globalização do clube, sabendo-se, como se sabe, que Vilarinho e Luís Vieira até estão bem acompanhados nesta difícil cruzada que é a reabilitação do Benfica.
E essa globalização, esse levar o Benfica real aos benfiquistas reais, tem de começar com a extinção do sócio correspondente, passando-o a sócio efectivo.
Com quota fixa, montante fixo, cartão igualzinho, com os mesmos direitos, as mesmas regalias e os mesmos deveres.
A campanha de captação desses sócios deve começar de dentro para fora e o Benfica tem nos seus quadros um homem com capacidade para dar início a esse trabalho.
Luís Costa, director do departamento de sócios, pode passar a funcionar como elo de ligação com a imensidão de benfiquistas fora de Portugal, contactando-os directamente, com visitas constantes aos lugares de maior concentração benfiquista, montando máquinas de funcionamento nesses lugares e deixando gente responsável à frente dos mesmos. Não tem Portugal os consulados espalhados por toda a parte? Não é isso, noutra dimensão e noutro carácter bem mais importante, que fazem com passaportes, bilhetes de identidade e atestados de vida e residência? O Benfica precisa de montar os seus ‘consulados’, os seus pontos de referência, os seus contactos e as suas fontes de receita.
E, tanto os responsáveis do Benfica como os filiados nas não sei quantas casas do Benfica espalhadas por esse mundo fóra, têm de compreender, de uma vez por todas, que o folclore das festinhas e jantares de circunstância devem continuar, sim senhor, devem servir para os jogos de matraquilhos e gritos de júbilo quando o Mantorras marca um golo ou atirar socos para o ar a ver se apanham a cabeça do Jardel, deve esse folclore existir, sim senhor, mas há que juntar ideias e esforços e saber ver que a realidade benfiquista dos nossos dias está bem mais necessitada de outra actividade, de outra mentalidade, de outra produção e de outro futuro.



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