O Movimento Cultural Terra de Miranda (MCTM) afirmou hoje que pode recorrer aos tribunais para exigir o pagamento dos impostos referentes à venda das seis bagagens transmontanas se o Estado não "honrar a sua palavra”.
“Se os impostos que consideramos serem devidos - IMI, IMT, Imposto do Selo e IVA da produção de eletricidade - não forem liquidados e pagos, recorreremos aos tribunais para obrigar a que se cobre o que é das populações, por direito”, explicou à Lusa Óscar Afonso, membro do MCTM.
Por outro lado, este movimento admite, ainda, que se avance para o poder judicial para que o Governo cumpra a obrigação legal de criar o fundo que irá administrar todas as receitas e que foi aprovado pela Lei do Orçamento do Estado (OE) para 2021.
“Admitimos, igualmente, recorrer aos tribunais para a anulação do negócio da venda das bagagens, caso a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) continue a entender que, para efeitos fiscais, os edifícios das barragens são bens do domínio público e, por isso, não estão sujeitos ao IMI. Esses edifícios e construções foram transmitidos no negócio, estavam no balanço da EDP e agora transitaram para o balanço da Movhera; pelo que o IMI é devido. Acresce que a Lei impede a venda de bens do domínio público”, indicou à Lusa a mesma fonte.
Para o MCTM, “o passado mostra que a Administração Central nem sempre honrou a sua palavra”.
“Ainda há menos de dois anos, o ex-ministro do Ambiente garantiu no seu gabinete que só autorizaria a venda das barragens se fossem pagos os impostos devidos”, vinca o Movimento.
“É nosso entendimento que todos os impostos são devidos, no que agora parece que somos acompanhados pela Autoridade Tributária (AT). Porém, só com determinação, união, coragem e sem medo conseguiremos eliminar os constrangimentos que estão a impedir que eles [impostos] sejam liquidados e pagos”, frisou Óscar Afonso.
Questionada pela Lusa, a AT avançou que as questões relacionadas com a situação tributária de contribuintes específicos, incluindo a tributação de operações concretas, estão protegidas pelo dever de sigilo fiscal, previsto no nº 1 do art.º 64º da Lei Geral Tributária.
“Não obstante, o Ministério Público (MP) divulgou já publicamente a existência de uma investigação criminal da AT neste domínio, sob direção do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DICIAP) no qual se investigam factos relacionados com o negócio da transmissão de seis barragens do grupo EDP para o consórcio francês integrado pela Engie, Crédit Agricole Assurances e Mirova (Grupo Natixis). Em causa estão suspeitas da prática de crime de fraude fiscal”, explicou a AT numa nota enviada à agência Lusa.
Segundo a AT, “existindo eventuais indícios da prática de crime fiscal, que levem à abertura de um inquérito crime, durante os procedimentos de natureza criminal suspende-se o prazo para o procedimento de inspeção tributária, podendo os montantes de imposto eventualmente em falta ser recuperados naquele âmbito ou, caso tal não se verifique, sendo o prazo para a AT efetuar uma eventual liquidação de impostos alargado até um ano após o arquivamento ou trânsito em julgado da sentença em matéria criminal”.
A AT adiantou ainda que “não partilhou qualquer informação sobre diligências no âmbito do inquérito criminal, o qual decorre sob a direção do Ministério Público, remetendo exclusivamente para a informação que aquela autoridade judiciária entendeu divulgar”.
“Sublinhe-se, porém, que a avaliação dos factos em causa não está suspensa, estando a decorrer no âmbito da investigação criminal levada a cabo pela AT, sob direção do Ministério Público”, indicou a AT.
Quanto à tributação dos edifícios e construções que integram os aproveitamentos hidroelétricos em geral, os municípios foram informados das diligências em curso junto da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Relativamente ao IVA, foram informados de que não há qualquer diligência pendente por parte da AT e que a matéria da transferência da receita do IVA para os Municípios é da competência da Direção Geral das Autarquias Locais (DGAL).
No dia 21 de junho, os autarcas dos municípios transmontanos abrangidos pelas seis barragens vendidas pela EDP disseram acreditar que os impostos resultantes desta transação serão liquidados, mas lembram que decorre um processo no Ministério Público pelo qual é preciso aguardar.
“Estamos em crer que os impostos devidos serão liquidados, mas não nos podemos esquecer que há um processo que decorre no Ministério Público (MP) pelo que é preciso aguardar pelo seu desenrolar e desfecho”, explicava à data o presidente da Comunidade Intermunicipal (CIM) Terras de Trás-os-Montes, Jorge Fidalgo.
As declarações do presidente da CIM foram prestadas à margem de uma reunião com a diretora geral da AT que decorreu em Lisboa e que juntou os autarcas de Mogadouro, Miranda do Douro, Torre de Moncorvo, Carrazeda de Ansiães e Vimioso, no distrito de Bragança. Já do distrito de Vila Real marcou presença a autarquia de Murça.
A EDP vendeu seis barragens em Portugal a um consórcio de investidores formado pela Engie, Crédit Agricole Assurances e Mirova, por 2,2 mil milhões de euros.