O movimento cívico ‘Pró Nadir’ disse que a Revolução de Abril proporcionou a liberdade de defesa do património ameaçado, como a panificadora desenhada pelo arquiteto Nadir Afonso, em Vila Real, que está risco de ser demolida.

Cerca de 30 pessoas participaram na quarta-feira à noite, em Vila Real, numa tertúlia seguida de vigília contra a demolição da antiga panificadora projetada pelo arquiteto e artista transmontano, um edifício que está degradado, de propriedade privada e que vai ser vendido a uma cadeia de supermercados.

A iniciativa foi promovida pelo movimento cívico ‘Pró Nadir’ que se opõe à demolição do edifício construído em 1965, ano em que Nadir Afonso abandonou a arquitetura para se dedicar por inteiro à pintura.

“O 25 de Abril trouxe-nos isso, a possibilidade de sermos nós próprios a defender o nosso património e é isso que nós vamos continuar a fazer nos próximos dias”, afirmou Mila Simões de Abreu, investigadora da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e que integra o movimento.

A também arqueóloga adiantou que “há um prazo retórico de cerca de um mês” até à concretização do contrato-promessa de compra e venda daquele espaço.

“Vai haver uma campanha eleitoral e vamos também participar nela ativamente, porque o Nadir Afonso tem uma dimensão internacional”, garantiu.

Laura Afonso, viúva de Nadir Afonso, associou-se à vigília e esclareceu que está a lutar “pela preservação do edifício”.

“Porque tem características únicas e é um belo exemplar do património industrial e Vila Real ficaria muito mais rica se preservasse esse edifício”, sustentou.

Laura Afonso mostrou-se “triste” porque “o estado avançado de degradação da panificadora se deve a um ato voluntário”.

“Quando uma retroescavadora entra lá, após o pedido de classificação do edifício, levanta suspeitas”, referiu.

A arquiteta Ana Morgado escreveu uma tese de mestrado sobre a panificada e foi quem avançou com o pedido de classificação para imóvel de interesse público em 2016, que foi arquivado em 2018 pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC).

A DGPC considerou que o edifício já não reúne características para uma classificação de âmbito nacional.

“Considero que o património industrial moderno no nosso país ainda não é reconhecido, infelizmente”, afirmou Ana Morgado.

A arquiteta disse que a “fachada, a cobertura e o forno” eram os "três elementos que sustentavam a classificação", notando que foram "precisamente esses três elementos que foram destruídos" durante o período de análise do pedido de classificação.

“A estrutura está toda lá, basta reconstruir a fachada, as coberturas e o edifício tem tudo para dar uma nova vida à cidade”, defendeu.

Ana Morgado lembrou que Nadir Afonso trabalhou com os arquitetos Le Corbusier e Oscar Niemeyer e que a panificadora “tem referências de ambos”.

O movimento lembrou ainda o pedido de classificação como imóvel de interesse municipal, que deu entrada na câmara no final do ano passado e ao qual não obteve resposta.

Contactada pela agência Lusa, fonte da cadeia de supermercados Lidl disse estar “em processo de aquisição do terreno onde se encontram as ruínas das antigas instalações da panificadora” e explicou que “planeia, com este empreendimento, renovar a loja existente em Vila Real, dando não só uma melhor experiência de compra aos seus clientes, como melhores condições de trabalho aos seus colaboradores”.

“O projeto que surgirá na sequência desta aquisição está neste momento a ser desenvolvido. É intenção do Lidl incluir uma componente de valorização do artista em causa”, salientou a fonte.

A panificadora de Vila Real esteve em funcionamento até à década de 90 do século passado, altura em que entrou em falência, tendo desde então estado ao abandono.

Este edifício é similar ao da panificadora de Chaves, construída em 1962. Os dois imóveis marcam a carreira de Nadir Afonso, por serem os seus últimos projetos de arquitetura.



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