A música que se ouve no Hospital de Dia de Oncologia quer ajudar os doentes em tratamento, arrancar sorrisos e proporcionar partilhas, no âmbito de um projeto de musicoterapia que está a ser implementado em Vila Real.
“A música é uma medicina para a alma. A farmacologia trata o corpo, mas a alma precisa de arte, de música, de poesia e faz toda a diferença”, afirmou Cecília Peironi, farmacêutica hospitalar no Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD).
Cecília Peironi é uma das mentoras do projeto MuPSICarte e Francisco Sousa é o musicoterapeuta que toca guitarra clássica e canta para os doentes oncológicos três manhãs por semana.
“São tratamentos longos, morosos, difíceis e a música serve como uma aragem, um desfoque, no fundo, da doença”, salientou Francisco Sousa, um professor de música que está a estagiar no CHTMAD no âmbito do mestrado em musicoterapia, da Universidade Lusíada (Lisboa), o único mestrado nesta área existente em Portugal.
As músicas são escolhidas cuidadosamente. Os primeiros acordes, mais de relaxamento, podem ser de bossa nova, jazz ou música clássica. Depois, na parte cantada, Francisco Sousa recorre ao repertório português como, por exemplo, os Xutos & Pontapés que arrancam sorrisos e põem doentes, enfermeiras e auxiliares a trautear as letras mais conhecidas.
Numa das sessões acompanhadas pela agência Lusa, o octogenário Gualdino Carvalho não resistiu a dar um pé de dança primeiro com uma enfermeira e depois com uma auxiliar.
“A música? Ao menos diverte a gente (…). Nem só de pão vive o homem”, afirmou o doente de 87 anos que faz tratamentos há cerca de um ano.
Maria Santos, 64 anos e a fazer quimioterapia desde janeiro, disse que a música ajuda a passar o tempo do tratamento, garantindo que os doentes são “muito bem tratados” no Hospital de Dia. “Havendo música há mais alegria, há um bem-estar”, frisou.
Carla Pinto, 48 anos e em tratamento há nove meses, contou que a música diverte e ajuda as horas a passarem “mais depressa”.
“São músicas que a gente conhece”, referindo que também vai cantando “alguma coisa”.
O objetivo do projeto é, segundo Francisco Sousa, proporcionar uma “experiência auditiva ou até cantada que ajude a pessoa a estar mais presente, a dar um bem-estar, uma alegria”.
“E tenho visto que consigo atingir esses resultados”, sublinhou, destacando o caso de uma “doente surda-muda que se envolveu e participou”.
Marta Sousa, diretora do serviço de Oncologia do CHTMAD, acrescentou que o projeto tem como objetivo “alegrar os doentes que passam por um momento muito difícil”, referindo que há estudos que indicam que a musicoterapia ajuda também “a reduzir os efeitos da quimioterapia”.
“Fazer um tratamento de quimioterapia é um momento marcante e difícil e a verdade é que o Francisco tem animado muito os dias dos nossos doentes. Há ‘feedbacks’ muito positivos”, salientou a responsável.
A propósito Cecília Peirone acrescentou: - “Sou profissional de farmácia, sou especialista em medicamentos, mas há certas áreas em que o medicamento não chega e é aí onde a música e a arte fazem toda a diferença”.
Marta Sousa admitiu que gostaria de ver o projeto implementado também nos serviços de Oncologia de Chaves e Lamego, do CHTMAD, e de Macedo de Cavaleiros, integrado na Unidade Local de Saúde do Nordeste, mas onde os médicos do CHTMAD vão dar consultas e fazer tratamentos.
Para além do Hospital de Dia de Oncologia, o projeto MuPSICarte está também a ser implementado no serviço de internamento de Psiquiatria do CHTMAD.
A primeira vez que Cecília Peironi levou a viola para o hospital foi para tocar para um colega que fazia anos e estava hospitalizado. Aos poucos foi percebendo que estes “miminhos” ajudavam os doentes e a Associação Música Esperança Portugal, da qual faz parte, acabou por formalizar um protocolo com o CHTMAD.
O projeto MuPSICarte começou precisamente a ser implementado no serviço de internamento de Psiquiatria. “Nós achávamos que era um sítio que estava a precisar de uma intervenção com mais tempo e mais organizada”, contou Cecília Peironi.
A música, apontou, tem ajudado doentes que estavam muito isolados.
“Tivemos o caso de um senhor que presenciava, mas não participava e um dia pegou na viola e começou a tocar música andaluza e flamengo. Na psiquiatria veem-se coisas realmente muito engraçadas”, contou.