A mais recente obra de Alexandre Parafita é composta por cerca de 224 contos populares jocosos e anti-clericais, que, segundo o autor, \"estavam em risco de extinção, juntamente com a memória dos mais idosos\". Os contos foram recolhidos em 75 aldeias e vilas da região e a pesquisa incluiu lares da terceira idade. A obra contou ainda com a colaboração de 57 professores e educadores.

A obra, denominada \"Contos Jocosos e Anti-clericais\", é composta por sete partes, onde os contos são classificados como contos de padres, contos obscenos, contos de mulheres de mau génio, comilonas, preguiçosas e linguareiras, contos de doidos e de avarentos, contos de galegos e de povos vizinhos e rivais, contos de crítica de usos e costumes e, por último, outros contos jocosos e divertidos.

Alexandre Parafita explica que nestes contos \"há a presença da obscenidade e do erotismo, juntamente com a crítica mordaz à hipocrisia das relações humanas e aos puritanismos falsos e ocos, tal como são encarados na tradição do povo rural\". As mulheres, acrescenta, \"são geralmente caricaturadas na literatura oral como preguiçosas, levianas, comilonas e mentirosas, o que retrata, por um lado, um sentimento machista que vigora no mundo rural e, por outro, um enorme complexo de inferioridade em relação à imagem feminina, sensual, intocável e irrepreensível, tal como foi sendo edificada nos sonhos masculinos, especialmente dos adolescentes e jovens\".

Religião não foi \"censurada\"

Apesar de alguns dos contos terem sido recolhidos há 20 anos, este trabalho, que será publicado no final do mês, representa oito anos de pesquisa. Para além da mulher, nestes contos está também retratada a figura do padre. \"A vida e as tentações carnais dos padres\", segundo o escritor, \"têm sido um campo fértil para as narrativas mais satíricas da literatura, e tal acontece porque, no meio rural, o padre é ainda um símbolo de boas práticas cívicas e morais e, nessa medida, incapaz do mínimo deslize de natureza mundana\". \"Daí que\", continua, \"o humor e a caricatura tendam a forçar a auréola puritana e austera do padre, satirizando-o nas situações em que o cânones são mais implacáveis\".

Os contos são datados a partir do dia da sua recolha por Alexandre Parafita. No entanto, alguns deles, devido ao cenário que descrevem, podem ser identificados com determinadas épocas.

A ausência de contos jocosos nas principais colectâneas publicadas no passado por alguns escritores de renome, como Adolfo Coelho, Teófilo Braga, Consiglieri Pedroso ou Leite de Vasconcelos, deve-se, segundo Alexandre Parafita, \"a um acto de censura por parte dos compiladores, dos informantes e da sociedade da época\". \"A circunstância de uma boa parte das fontes de informação serem padres e antigos professores primários dos meios rurais, levou, seguramente\", como explica o investigador, \"a que fossem ocultados os textos susceptíveis de afectar os dogmas da religião dominante ou de contrariar os desígnios da moralidade e dos bons costumes que a instituição educativa tentava então promover\".

\"Contos Populares Jocosos e Anti-clericais\" é o 24º livro de Alexandre Parafita e deve-se ao seu \"jeito especial para criar ambiente\", assim como à conquista e à \"abertura\" dos mais velhos para recordarem e lhe relatarem histórias da sua infância. Muitos dos idosos contactados pelo investigador sentiram-se \"válidos\" e \"importantes\" ao serem interpelados pela curiosidade do escritor nas muitas histórias que a sua memória ainda guarda.



PARTILHAR:

Du Maurier Arts apoia grupos artísticos

Cavaquinho, o adufe ou a guitarra