Foi pela calada da noite, que, a 13 Outubro de 1992, foram retiradas da estação de comboios de Bragança as composições que lá operavam. Enquanto a população da cidade dormia, às três da madrugada, locomotivas e carruagens da CP eram levadas para nunca mais regressar. Foi um marco na história do distrito, interpretado por muitos, como o início de um esvaziamento progressivo de serviços desconcentrados do Estado.

Nessa noite, \"fui acordado à uma da manhã, por um amigo que me telefonou, a alertar para o que ía acontecer\" recorda Fernando Guilherme, na altura presidente da Associação Empresarial de Bragança, e um dos principais opositores à retirada do comboio de Bragança.

\"Foi uma luta inglória\" confessa ao DN \"porque nenhum esforço deu resultado para evitar um processo inaceitável\" mesmo depois de um período de grande agitação e manifestações populares. Camiões e gruas chegaram à estação para levar da cidade um dos poucos meios de ligação ao resto do país. \"Opus-me fisicamente, mas fui detido pela PSP\" conta Fernando Guilherme que ficou \"triste por Trás-os-Montes\".

Apesar dos 13 anos que passaram, o sentimento de revolta permanece. Porque foi a partir daí que se iniciou o processo de esvaziamento...

Serviços ameaçados

Hoje, o inconformismo é agravado por rumores que dão conta de uma nova investida da administração central. No âmbito da reorganização escolar, em que o Governo quer encerrar todas as escolas do primeiro ciclo com menos de 20 alunos, já no próximo ano lectivo fecham as portas 239 escolas do distrito. Muitas aldeias vão ficar ainda mais despovoadas.

Na saúde, a população idosa teme o encerramento das urgências nocturnas nos centros de saúde. A tutela tenciona fechar todos os serviços com menos de 10 atendimentos por noite. Os utentes não aceitam porque vão ser obrigados a fazer grandes deslocações por estradas sinuosas.

O mesmo acontece com as maternidades. As unidades de Bragança e Mirandela não cumprem as normas internacionais de 1500 partos por ano. O fim de uma delas está agora nas mãos do conselho de administração do Centro Hospitalar do Nordeste. As grávidas vão ter de percorrer vários quilómetros para uma consulta, arriscando a fazer o parto numa ambulância a caminho do hospital...

O PS local já garantiu que nenhum serviço será encerrado no distrito, durante a governação do PS. Poucos acreditam.

Mirandela em risco

A confirmar-se, a cidade do Tua é a que pode vir a sofrer mais consequências com o encerramento de serviços públicos. Só nesta localidade há três serviços que podem vir a ser extintos. O autarca de Mirandela entende que o caso mais grave diz respeito à Direcção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes, da qual dependem cerca de 400 famílias. \"Se for feita a fusão com a de Entre Douro e Minho, e a sede sair daqui, vai haver reflexos negativos na economia local\", afirma José Silvano.

A esquadra da PSP, outro serviço em risco de desaparecer, dá trabalho a 55 agentes que teriam de abandonar a cidade. O edil está preocupado. Pois pode significar \"um perigo relativo para o distrito\" já que é \"um indício de que o comando de Bragança também vai acabar transferindo tudo para Vila Real\".

Manifestações populares

A população ainda não se mobilizou em protestos de rua. Mas o descontentamento é notório. Até agora já decorreram dois abaixo-assinados para marcar posição. Uma outra forma de reclamar foi encontrada pelo presidente da câmara de Mirandela. O autarca, que tem protagonizado esta luta, decidiu colocar um outdoor junto ao IP4, na entrada do distrito de Bragança, a dizer \"Aqui termina Portugal\", para dar a entender a quem ali passa que está a entrar numa zona sem pátria. Com esta iniciativa o autarca pretende mostrar que o distrito tem sido votado ao abandono pelos sucessivos Gover-nos e que as medidas que têm sido tomadas para a região só têm agravado a desertificação.

Uma acção isolada que tem merecido o apoio dos restantes municípios transmontanos. Avisam que se o Governo não se mostrar receptivo a estas pretensões, avançam para acções de protesto.



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