Armando Barroso, fazendo a custo um gesto para alcançar a nuca, explica que tem «duas hérnias cervicais e uma hérnia discal», além de outras «maleitas» adquiridas em trinta anos no setor da construção civil em França.

“Tenho 49 anos de idade, 30 de cotização e já estou totalmente aleijado. Tenho que trabalhar até aos 62 anos e não sei como é que vou fazer. E, como eu, muitos, que andam aí nas obras com 55 anos, já não conseguem sequer calçar as botas”, conta à Lusa o operário português num estaleiro de Puteaux, na periferia oeste de Paris.

Emigrantes como Armando Barroso, entrevistados pela Lusa, manifestam “grande preocupação” com a alteração do regime de reformas aprovada na semana passada pela Assembleia Nacional francesa.

Medidas como o aumento da idade legal mínima da reforma, de 60 para 62 anos, inquietam trabalhadores com tarefas consideradas penosas e perigosas, como a construção civil, um dos setores em que a emigração portuguesa está fortemente representada.

De pouco servem as “pequenas prendas do primeiro ministro François Fillon” na sequência da jornada de protesto de 07 de setembro, a que aderiram, segundo os organizadores, mais de 2,5 milhões de pessoas em toda a França, afirma o sindicalista Eduardo Barroso, irmão de Armando.

Os trabalhadores acompanham o debate sobre a “reforma das reformas” com a contagem dos seus “pontos”, a designação comum do número de meses de cotização que garante o direito à reforma. Pelo regime antigo, precisavam de 164 trimestres, explica Eduardo Barroso.

Os dois irmãos estarão de novo na rua na quinta feira, na jornada de protesto e greves agendada pelas centrais sindicais francesas, porque “neste setor, trabalhar até aos 62 ou aos 65 anos quer dizer dormir no cemitério durante a noite e vir de dia para o estaleiro”, ironiza Eduardo Barroso.

A luta dos emigrantes do setor da construção civil faz-se também “ameaçando fechar uma obra”. Esse poder dos portugueses, muito ativos a todos os níveis das estruturas sindicais, deriva da própria importância das obras em que trabalham, explica Eduardo Barroso.

“É uma maneira de trazer a democracia às empresas”, sublinha o operário português, aludindo a uma recente “ameaça” de paralisar a obra do museu de uma grande marca de luxo francesa, não longe de Puteaux, ou recordando o ano de 1999, quando ele e outros sindicalistas pararam as obras do “court” central do torneio de Roland Garros.

“Se eu não fosse delegado sindical, já me tinham comido como cães”, resume Armando Barroso.

“Chegado a esta idade, um homem já está estragado e não interessa à empresa, que nos tenta pôr no fundo de desemprego”, queixa-se outro operário português em Puteaux.

“Tenho 47 anos e devo trabalhar mais vinte anos para ter a cotização que me garante a reforma. Não sei como vou chegar lá”, resume Rocha Crespo, um emigrante de Monção que trabalha o dia inteiro numa grua, “a 50 metros do chão”.

Outros operários admitem também que “há ainda situações de portugueses que, apesar do direito à reforma, continuam a trabalhar para além da idade, porque precisam do dinheiro”.

“A reforma é para ser gozada, não é para ser vivida de bengala e de saco de medicamentos”, conclui Eduardo Barroso.



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