Tal como acontece em algumas zonas de Portugal, onde alguns cidadãos ainda se recusam a utilizar a nova moeda europeia e onde o escudo continua a ser a única forma de pagamento aceite por alguns empresários, muitos dos portugueses residentes no Luxemburgo continuam fiéis ao franco e mesmo os mais aventureiros confessam-se um pouco desorientados pela coexistência do euro e do franco.
Para a maioria dos entrevistados "a utilização das várias moedas só complica a vida. Era mais fácil acabar-se definitivamente com as outras", afirmaram os comerciantes e consumidores "ansiosos que chegue Março para ficarmos só com o euro."
Embora a maioria dos estabelecimentos se diga bem preparada para trabalhar com euros a verdade é que bastou um pequeno número de entrevistas para nos apercebermos que os erros não são assim tão raros. É que basta uma vírgula mal colocada para que 10 euros se transformem em 100 e 100 em 1000, e por aí em diante…
Calculadora sempre à mão
Na mercearia Casas de Portugal, Lurdes Pereira afirma ter-se adaptado bem à nova moeda e acrescenta mesmo trabalhar quase exclusivamente com euros. "Aqui a clientela é praticamente toda portuguesa e todos, de uma forma geral, usam o euro". Quanto a eventuais dificuldades de cálculo, a máquina calculadora, sempre à mão, encarrega--se de desfazer as dúvidas: "Com a máquina de calcular acaba por não ser difícil. Sinceramente, estava à espera de pior".
Para Lurdes Pereira "o euro é bem-vindo e além do mais facilita-nos muito a vida quando queremos viajar".
Erros são frequentes
As compras de Lucinda Costa iam ficando 100 euros mais caras não fosse a confirmação do recibo e algumas contas de cabeça que a levaram a pedir um novo cálculo, embora já tivesse na mão uma nota de 100 para efectuar o pagamento.
O erro foi rapidamente reconhecido: "Não são 116 euros são 11,6", corrigiu de imediato a empregada da loja.
Segundo Lucinda Costa, este tipo de confusões são vulgares: "Nas compras é mais complicado e é necessária muita atenção. Erros como este acontecem com facilidade enquanto não estivermos habituados. É que sem o preço afixado em francos é mais complicado ter uma noção real dos preços".
Apesar destes pequenos inconvenientes, esta portuguesa residente em França não esconde a sua satisfação pela a adopção da moeda única: "Estou contente. Vai-nos custar um pouco a habituar, mas é sem dúvida melhor assim. Principalmente para pessoas que como eu que vivem em França e se deslocam diariamente para o Luxemburgo".
70% paga em francos
Nas caixas dos supermercados Prima o franco continua a dominar. Segundo as empregadas das caixas, 70% dos pagamentos em dinheiro são feitos com francos, embora durante o tempo em que o CORREIO esteve neste supermercado tenhamos observado que, pelo menos metade dos clientes, utilizaram euros.
A facilidade com que as empregadas convertiam francos em euros e vice-versa era notória. O mesmo já não se pode dizer dos clientes. Houve mesmo quem deixasse gorjetas – prática pouco frequente nos supermercados.
Numa das caixas, a funcionária Damateaux confessou o pânico vivido antes de 1 de Janeiro: "A princípio a ideia de trabalhar com uma moeda nova e continuar a aceitar as antigas foi assustadora, mas depois acabamos por nos habituar rapidamente.
"Era melhor utilizar só euros", concluiu, admitindo "ainda ando desfazer-me dos francos".
Transição está mal
"Deviam ser só euros!", afirmou, convicto, Carlos Rodrigues, empregado do restaurante Good Friend.
Também no conhecido restaurante português se nota a resistência ao euro. A maioria dos clientes ainda paga em francos e recebe, com tranquilidade, o troco em euros. Aqui, a tarefa do cliente acaba por ser mais fácil. O período de tempo entre a entrega da conta e o pagamento depende do cliente e é agora vulgarmente utilizado para um relaxado exercício mental na companhia de um café. Aparentemente, as gorjetas em notas tornaram-se mais raras sendo muitas vezes substituídas por "incómodos trocos" mais valiosos do que era habitual.
"Não é fácil. Receber em francos, dar o troco em euros e fazer a conversão novamente em francos para explicar ao cliente, torna-se por vezes complicado". Para Carlos Rodrigues o euro "é bem-vindo, o que está mal é o período de transição. Deviam-se utilizar exclusivamente euros! Eu é o que faço."
Escudos no museu
Ele prefere pagar em euros e ela em francos.
Para Gilberto Ferreira a conversão em euros não traz dificuldades de maior: "Arredonda-se para 40 e já está". Para a esposa o maior problema são as compras: "O mais complicado é nos supermercado ou nas lojas".
Para o casal Gilberto e Virgínia Ferreira o escudo deixou mais do que saudades: "Já guardámos alguns para o nosso museu", disse-nos Virgílio Ferreira enquanto a sua esposa lamentava o desaparecimento das moedas de cada um dos doze países: "Era melhor como antigamente quando cada um tinha a sua moeda. Fazia parte da cultura de cada país e sempre era mais fácil".
Cuidado com os notas de 500
Nos bancos a passagem para o euro tem provocado um volume anormal de trabalho. Segundo Jorge Dias, director do Banco Totta & Açores, "este aumento deve-se essencialmente à curiosidade dos clientes em "sentirem a nova moeda, devendo-se manter ainda durante as próximas semanas".
Nos contactos que tem mantido com os comerciantes e com os clientes, Jorge Dias, tem também notado as dificuldades causadas pela utilização simultânea das diferentes moedas: "Colocar as pessoas a funcionarem como agentes de câmbio tem sido de facto uma experiência complicada. Quem optou por este sistema, fê-lo com a intenção de facilitar as transações, mas devo admitir que provavelmente não terá sido a melhor opção."
Durante este período de adaptação, Jorge Dias aconselha "sobretudo muita atenção com as notas de maior expressão, como as de 500 euros. Seria eventualmente aconselhável evitar o seu uso durante esta primeira fase. Convém não esquecer que nestas alturas há sempre quem procure tirar partido da situação."