Fernando Gaspar Baptista, de 50 anos, natural da Covilhã, foi morto no dia 18, por assaltantes que o surpreenderam ao regressar a casa em Bez Valley, um bairro de Joanesburgo, onde decorreu o serviço religioso.
O ambiente pesado durante as cerimónias do dia 27 foi ainda agravado pela hospitalização esta semana de mais dois portugueses, vítimas de actos de violência criminal, José Gomes e Maria Bela Ferreira internados no hospital privado de Union, em Alberton, arredores de Joanesburgo.
Em menos de 12 horas, os dois foram atingidos a tiro em locais distintos daquela cidade. José Gomes encontra-se em estado de coma profundo e Maria bela Ferreira a recuperar de um ferimento no pé direito.
Carlos Gabriel preencheu a homília com a descrição do drama que atinge toda a sociedade sul-africana e que o levou, em finais do ano passado, a liderar uma marcha de paz em Pretória para exigir medidas de segurança ao executivo de Thabo Mbeki.
"Incidentes como o que ceifou a vida a Fernando Gaspar mexem com a fibra de todos nós, mexem com a minha fibra e foi isso que motivou o grito de dor que lançámos e volto agora a dirigir aos governos da África do Sul e de Portugal", afirmou, sublinhando que "alguém tem de pôr mão nesta barbaridade" e não são os "cidadãos civis, quem pode ou tem a responsabilidade de o fazer".
"Esta é a tragédia da África do Sul, a tragédia em que vive neste país cerca de meio milhão de portugueses, à mercê de esquadrões de morte que aterrorizam toda a gente", prosseguiu.
O padre Gabriel denunciou depois aqueles que o pretendem calar de co-responsabilidade na persistência deste drama, ao adiarem a solução do mesmo, fechando os olhos por receio de irritar as autoridades sul-africanas.
"Eu achei que finalmente se tinham passado todos os limites, quando, a 24 de Maio do ano passado, celebrei um serviço religioso por um casal morto por assassinos como aqueles que tiraram a vida ao Fernando Gaspar. Ali, à minha frente na igreja, estavam quatro crianças órfãs, que nunca deveriam ter sofrido tal experiência", insistiu.
A manifestação e o teor de um memorando entregue na altura ao governo sul-africano provocou uma reacção agressiva de Pretória, que acusou os portugueses de racismo, por nunca antes terem levantado um dedo contra o sistema de apartheid e fazerem agora exigências ao executivo do ANC.
A resposta do ministro da Segurança sul-africano levou diversos sectores da comunidade portuguesa a distanciarem-se da iniciativa do padre, acusando-o de "estar feito" com a extrema direita e pôr em perigo os emigrantes portugueses ao colocá-los publicamente numa atitude de contestação contra o actual governo de maioria negra.
"Aqueles que nos acusam estão de olhos fechados perante o que está a acontecer neste país", ripostou o padre durante a homília.
"Querer silenciar-nos é não ter interesse pela comunidade portuguesa. Não sou pessoa que tem medo de acusações e é por isso que vamos manter esta chama acesa", prosseguiu.
"Se o nosso grito feriu o governo sul-africano, isso nunca foi a nossa intenção", afirmou, destacando: "Não foi um grito político, foi um grito humano de desespero e de solidariedade com quem sofre. Não me cansarei, mesmo que os meus telefones estejam sob escuta ou que me continuem a ameaçar".
O padre Gabriel apelou depois aos órgãos representativos da comunidade para pressionarem o governo português "a manter este flagelo nas suas preocupações".
"Caso contrário" - avisou - "poderá haver um êxodo muito grande de portugueses da África do Sul, semelhante ao de Angola, que ainda não está no horizonte e é agora o tempo certo de tomar medidas para ser evitado".
O corpo de Fernando Gaspar seguiu em avião da TAP para Portugal - acompanhado por sua irmã Isaura Gaspar (que viajou expressamente de Lisboa para o efeito) devendo ser sepultado quinta-feira em Unhais-Velho, Covilhã, sua terra-natal.



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