Entendimentos entre esquerda e direita são raros nos dias que correm. Nem na promoção da alheira deputados se entendem. Grupo de trabalho procurou um texto conjunto, mas só a "geringonça" se aliou.

O Presidente da República bem pede consensos. Ora na Saúde, ora na Educação, ora na Segurança Social. O Presidente da Assembleia da República repete o número e passa o tempo a pedir às duas maiores forças do Parlamento para se entenderem, por exemplo, na nomeação dos juízes do Tribunal Constitucional ou do presidente do Conselho Económico e Social. A necessidade de entendimentos para reformas estruturais está por toda a parte, mas nem por isso tem frutos. A verdade é que PS e PSD não se entendem. Nem na questão da promoção da alheira. Tentar, até tentaram, mas em vão.

Foram precisas três reuniões de um grupo de trabalho sobre a promoção e valorização da alheira para os deputados chegarem à conclusão de que não havia entendimento possível entre a esquerda e a direita. O grupo foi constituído em fevereiro para discutir em pormenor os quatro projetos de resolução que tinham dado entrada no Parlamento sobre o tema e fazer a tentativa de agregar tudo num único texto. Em vão. Na alheira como no país, PS, PCP e BE mostraram-se unidos e concertaram posições para um documento conjunto, mas PSD não abdicou das suas propostas e vai mesmo manter o seu projeto de resolução sobre a criação de incentivos fiscais e a canalização de apoios nacionais e comunitários para os produtores de alheira.

Assim, terminada a reunião desta quarta-feira do grupo de trabalho, concluiu-se que seguem para votação no plenário da próxima sexta-feira, dia 20, dois projetos de resolução diferentes, sendo que o da direita segue viagem com o chumbo garantido. O grupo de trabalho reuniu-se duas vezes “para tentar a convergência”, mas o PSD “não abdicou” de, por exemplo, querer reduzir a Taxa Social Única para os postos de trabalho relacionados com o setor ou da ideia de criar uma linha de crédito direta de 30 milhões de euros para os produtores de alheira, explicou ao Observador um dos deputados presentes no grupo de trabalho.

Tudo propostas de medidas que envolvem impacto orçamental e que o PS recusou. Tanto PS como PCP e BE defenderam que o Parlamento deve recomendar ao Governo que “dinamize”, “defenda”, “promova” e “valorize” a alheira, considerada “ex-libris da gastronomia trasmontana”, depois de o setor ter sido abalado no final do ano passado com “notícias alarmistas” sobre casos de botulismo alimentar. Mas recusaram as propostas da direita de mexer nas contas do Estado e dos fundos comunitários.

O PSD insiste e vai mesmo recomendar ao Governo um vasto conjunto de medidas financeiras de ajuda ao setor. Primeiro, a criação de uma linha de crédito no valor de 30 milhões de euros a disponibilizar durante os anos 2016 e 2017 “para responder às dificuldades de tesouraria das empresas, apoiar a concretização de investimentos em curso e manter os postos de trabalho”, depois reduzir o IVA das alheiras para a taxa mínima de 6%, atribuída aos produtos de primeira necessidade; e ainda reduzir a TSU para 2,75% para “todos os postos de trabalho mantidos e a criar” no setor.

Tudo em nome da “herança cultural que importa preservar” e “dos milhões de consumidores nacionais e estrangeiros que querem continuar devotos da alheira”, explicam no projeto de resolução.

Os projetos de resolução seguem na próxima quarta-feira para a comissão de Economia e na sexta-feira seguinte para o plenário onde vão ser votados. O final é previsível: a esquerda unida em torno da alheira, o PSD com o seu texto chumbado e o PAN contra a mera ideia de se estar a discutir o cisma da alheira.
Lusa/RDinis



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