Agosto foi implacável com as florestas de Vila Real. Em apenas um mês, verificaram-se no distrito 995 incêndios, mais 154 que os registados no ano passado, na mesma época. Os concelhos de Chaves, Montalegre, Vila Real e Valpaços foram os mais dizimados pelas chamas. Em Bragança, o número de incêndios é sensivelmente o mesmo que em 2001, mas a área ardida é maior.
O Inspector Distrital dos Bombeiros Voluntários do Sistema Nacional de Bombeiros, João Lima, considera que o mês de Agosto foi \"crítico\". Houve dias em que se chegaram a registar 53 frentes de fogos, tornando \"complicada\" a actuação dos bombeiros.
Nesse mês, a média de incêndios por dia situou-se entre os 30 e os 35. Apesar disso, o inspector garante que sempre teve \"homens suficientes para atacar as chamas\", e quando o número escasseava, recorria às corporações de bombeiros dos distritos vizinhos, como foi o caso de Bragança, Braga e Porto. Mas devido ao grande número de incêndios registados no mesmo dia, alguns locais de alto risco que estariam a ser patrulhados por bombeiros tiveram de ficar \"menos protegidos\", de forma a levar alguns destes bombeiros para frentes de combate ao fogo.
Segundo João Lima, o facto de serem bombeiros voluntários \"não atrapalhou\" o combate às chamas, visto que ao toque da sirene \"chegaram a aparecer mais bombeiros do que aqueles que estavam registados no dispositivo de combate aos fogos\".
Em todo o mês de Agosto, o Centro de Coordenação Operacional de Vila Real (CCO) registou 995 incêndios, mais 154 do que na mesma época do ano passado.
Alguns concelhos não foram poupados pelas chamas. Chaves, com 147 incêndios, foi o que mais fogos registou. Montalegre com 129, Vila Real com 126 e Valpaços com 122, foram os concelhos que se lhe seguiram em termos de números de focos de incêndios registados pelo CCO.
Por sua vez, os incêndios que se registaram em Boticas foram os que durante mais dias queimaram. Segundo João Lima, estes fogos chegaram a arder durante seis dias seguidos, \"uma maratona\", não só para o inspector, como para todos os bombeiros que permaneceram no terreno a combater as chamas. O cansaço e o desgaste do material utilizado durante tantas horas sem descanso foi um entrave ao combate aos fogos, mas sempre ultrapassado pelos soldados da paz. E apesar de nenhum deles ter sofrido ferimentos graves, durante o mês de Agosto tiveram de ser assistidos cerca de 22 bombeiros.
Outro obstáculo que os bombeiros tiveram de enfrentar está relacionado com os \"maus acessos\" aos locais em chamas e a \"falta de água\". Por vezes, os helicópteros, quando iam buscar um carregamento de água a um local determinado e localizado pelos bombeiros, encontravam o local seco, sem água. \"Temos tudo cartografado\", explicou o inspector, e, por isso, quando o helicóptero encontrava uma reserva de água seca, \"indicávamos-lhe logo outra\".
Maioria é fogo posto
Segundo dados oficiais da Direcção Geral de Florestas, até ao dia 25 de Agosto Vila Real foi o distrito onde se verificaram mais incêndios, representando 13,7 por cento do total de fogos a nível nacional. E João Lima garante que \"a grande maioria dos incêndios foram fogos postos\". Ele próprio já se deparou com cenários \"estranhos\" no meio dos matos. Em alguns locais, no interior de florestas, por baixo da caruma, o inspector já encontrou velas, iguais às que são utilizadas para colocar nos cemitérios. Estes casos, assim como os de alguns incêndios que deflagraram, estão a ser já investigados pela Polícia Judiciária por existirem claros indícios de fogo posto.
Os dias 7, 15 e 23 de Agosto foram os mais fustigados pelos incêndios. No dia 7 foram detectados 45 focos de incêndio no distrito de Vila Real, e no dia 23 o CCO registou 51fogos. O dia da abertura da caça, por coincidência ou não, foi o dia em que mais incêndios deflagraram no distrito. Só neste dia, os bombeiros tiveram de acorrer a 53 incêndios.
Após um mês de intensa actividade, e depois das chuvas \"abençoadas\" caídas no final do mês e que vieram acalmar os fogos, os bombeiros vivem agora momentos de maior paz. Contudo, é hora de \"fazer uma avaliação ao dispositivo utilizado durante este mês e proceder-se a reajustamentos\", diz João Lima, \"para que, no próximo ano, tudo corra melhor\". Para além disso, e perante o desgaste de alguns materiais utilizados pelos bombeiros ininterruptamente no combate aos fogos, o Serviço Nacional de Bombeiros já está a proceder à distribuição de novos materiais, inclusive viaturas novas, a algumas corporações do distrito, para as equipar \"convenientemente\" já para o próximo ano.
Bragança com mais área ardida
No distrito de Bragança, este ano não foi muito diferente do ano passado em termos do número de incêndios ocorridos no período entre 1 de Julho e 2 de Setembro, período este integrado na chamada \"fase bravo\", que se prolonga até ao dia 30 do corrente mês.
Em 2001, o número de fogos florestais ascendeu aos 664, incluindo os chamados \"fogachos\", ou seja, fogos com uma área ardida inferior a um hectare, que de resto tiveram bastante significado neste ano, como sublinha o inspector geral dos Bombeiros do Distrito de Bragança, Vaz Pinto. O inspector justifica este fenómeno com o facto de 2001 ter sido \"o ano mais chuvoso dos últimos cem anos\".
O mesmo não aconteceu no corrente ano. Os 641 incêndios ocorridos até agora corresponderam a mais vastas áreas ardidas, devido também ao vento que tem caracterizado a época estival e que tem facilitado a propagação mais rápida dos incêndios, como explica Vaz Pinto.
Esta diferença é inclusivamente comprovada pela relação entre o número de incêndios e o número de horas despendidas a combatê-los, como constata Vaz Pinto. Em 2001, 7652 bombeiros levaram 2642 horas a extinguir os fogos. Este ano, 7377 homens passaram 3211 horas no combate às chamas.
Em relação ao número de bombeiros feridos e mortos na extinção de incêndios, este ano revela-se mais positivo até agora, em relação a igual período de 2001, quando se tinham registado já sete feridos e um morto. Este ano, apenas há registar três feridos.
E enquanto os números relativos aos incêndios florestais não baixam, Vaz Pinto vai deixando o alerta: \"os fogos florestais não se apagam, evitam-se\".