Há uns anos, milhares de trabalhadores deixaram as regiões Norte e Centro do país para trabalhar nas obras em Espanha. Um grupo de investigadores seguirá agora no encalço destes portugueses até ao Luxemburgo e Reino Unido.

Já foram mais de 100 mil os portugueses inscritos na Segurança Social espanhola. Hoje, não passam de 40 mil. A “bolha imobiliária” rebentou e com ela desacelerou bruscamente o ritmo da construção civil. Que aconteceu aos portugueses, sobretudo do Norte do país, que há cinco anos eram notícia pelos trajectos pendulares que faziam entre Portugal e Espanha ao ritmo de uma viagem por semana?

“Sofreram uma dupla desestruturação social”, responde o sociólogo João Queirós, co-autor de um trabalho sobre os movimentos migratórios no Noroeste português que é apresentado nesta quinta-feira na Universidade do Porto, num seminário internacional sobre a emigração portuguesa em Espanha.

“Porque se tratava de um fenómeno pendular — com viagens de regresso a casa ao fim-de-semana ou de 15 em 15 dias —, esta emigração não possibilitava o estabelecimento de laços com a comunidade de destino. Mas, ao mesmo tempo, estes trabalhadores sofreram uma desvinculação dos colectivos de origem, com a quebra dos laços associativos e sociabilitários, porque os regressos a casa eram de fechamento em torno da família mais chegada, logo de quebra com a vida social local”, precisa o investigador da Universidade do Porto, que, com Bruno Monteiro, passou semanas no encalço destes emigrantes desqualificados.

Estudadas as origens — Rebordosa, em Paredes, de forte dependência da indústria do mobiliário, e Fonte Arcada, em Penafiel, onde a maioria da mão-de-obra masculina se emprega na construção civil — e o destino de acolhimento de um grupo de trabalhadores da construção civil (O Carballiño, na Galiza), os investigadores concluíram que estes operários foram auferir salários superiores mas pagaram caro a emigração pendular. “Observámos alguns casos de ruptura familiar. A mitologia em torno da ameaça de relações extraconjugais das mulheres que ficavam para trás estava sempre muito presente.”

Apesar de a emigração se ter apresentado “como um meio de acesso a remunerações mais elevadas”, como lembra João Queirós, “a verdade é que introduzia eixos de precarização da condição profissional e social destes homens”. “São homens de vidas muito frágeis, em que a dureza do trabalho que exerciam contrastava com fragilidades importantes na vida quotidiana e organizações familiares”, acrescenta o investigador.

Dado que o boom migratório para Espanha ocorreu sobretudo na primeira metade da década anterior e que, de então para cá, o desemprego tem subido a galope também em Espanha, onde param agora estes emigrantes das regiões Norte e Centro do país, maioritariamente jovens e desqualificados? “Alguns integraram a fileira do desemprego e muitos prolongaram a trajectória da emigração até países mais distantes”, responde João Queirós.

O próximo passo da investigação será regressar a Espanha, “procurando ver que portugueses estão ainda em Espanha e o que fizeram para contrariar os problemas de integração profissional naquele país”, como explica João Queirós, e, ao mesmo tempo, “criar pequenos observatórios” no Luxemburgo e no Reino Unido. “O ponto de partida continuará a ser a construção civil e, eventualmente, outras áreas relacionadas com esta, mas sem nunca sair do universo da emigração desqualificada.”

A investigação, financiada pela Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas, visa perceber “se se mantêm os efeitos da dupla desvinculação” e perspectivar “de que forma o Estado português pode acompanhar e enquadrar os emigrantes, protegendo-os dos efeitos mais nefastos deste movimento quase perpétuo de trabalhadores”.



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