O presidente da Câmara de Bragança, Jorge Nunes, experimentou hoje os «transtornos» causados à população transmontana pela suspensão das ligações aéreas com Lisboa, há já uma semana.
O autarca disse à Lusa que teve de sair de Bragança às 04:00 para fazer uma viagem de 500 quilómetros de automóvel superior a cinco horas, que poderia demorar apenas uma e meia, se houvesse voos.
Para estar numa reunião em Lisboa às 09:30, Jorge Nunes poderia ter chegado ao aeródromo local depois das 07:00, se o primeiro voo do dia tivesse descolado por voltas das 08:00.
Mas desde o dia 17 que a carreira aérea Bragança/Vila Real/Lisboa está suspensa por decisão da operadora, a ATA- Aerocondor Transportes Aéreos, que alega «problemas técnicos».
O dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (SINTAP), José Abraão, foi apanhado de surpresa há uma semana, quando se preparava para regressar de Lisboa a Vila Real.
Segundo disse à Lusa, comprou uma passagem de ida e volta, com regresso agendado para o dia 19, que lhe custou 106 euros.
Quanto maior for o número de passageiros, menos recebe do Estado, no caso, a Aerocondor que desde 1997 ganhou os concursos bianuais para esta carreira, com a excessão dos anos 2001/2003, em que foi entregue à OMNI.
Há um ano, a operadora cancelou e reduziu o número de voos, o que motivou protestos na região, à semelhança do que está a acontecer novamente.
O grupo parlamentar do PSD aguarda a resposta do ministro das Obras Públicas e Transportes, Mário Lino, a um pedido de audiência para falar precisamente do assunto.
O deputado Ricardo Martins, eleito pelo círculo eleitoral de Vila Real, diz que o PSD vai solicitar ao Governo que cumpra o que disse na resposta a um requerimento apresentado no ano passado.
Na resposta aos deputados do PSD, o Governo garantiu que »perante a hipótese de a ATA - Aerocondor Transportes Aéreos - romper o cumprimento das suas obrigações contratuais« procuraria, »por todos os meios ao seu alcance, encontrar uma solução para assegurar a continuidade dos serviços, nomeadamente recorrer, em simultâneo, ao lançamento de um novo concurso e ao ajuste directo para o período de tempo que mediar a sua conclusão«.
»Pois bem, estamos perante essa situação«, salientou Ricardo Martins, que disse ainda temer que a empresa »não tenha condições para continuar a operar devido às graves dificuldades financeiras que atravessa«.
Também a Câmara de Vila Real diz que vai aguardar que o Governo cumpra »aquilo que assumiu«, ou seja, que »seja alcançada uma resolução rapidamente.
O vereador Miguel Esteves disse à Lusa que a questão da Aerocondor vai estar em cima da mesa da reunião de câmara que decorre quarta-feira.
O autarca salientou a importância que a ligação área à capital tem para a economia local e regional, mas defendeu que o serviço tem que ser feito com «regularidade e sem falhas».
Por sua vez, o Governador Civil de Vila Real, António Martinho, afirmou que os contratos firmados entre o Governo e as empresas «são para serem cumpridos» e destacou a «utilidade» da ligação área de Trás-os-Montes a Lisboa em termos de «mobilidade e de desenvolvimento regional».
Apesar do incumprimento, o autarca de Bragança, Jorge Nunes, defende o contrato com a operadora «deve manter-se até existir uma alternativa viável».
Na região teme-se a perda deste serviço, se o Governo denunciar o contrato com a Aerocondor.
Para evitar este cenário, o presidente da Associação Empresarial do Distrito de Bragança (NERBA), Rui Vaz, entende que «o Estado deve assumir esta carreira, à semelhança do que faz com as ilhas da Madeira e dos Açores, através de uma companhia aérea sua comparticipada».
Ainda assim e apesar de considerar «a situação actual inaceitável», este dirigente associativo defende que «o Governo deve tomar todas as medidas possíveis para obrigar a operadora a cumprir».
A irregularidade dos voos, cancelados muitas vezes sem aviso aos passageiros «cria desconfiança e descredibiliza o serviço», na opinião de Rui Vaz.
Em 2007, foram cancelados mais de uma centena de voos, o que «ultrapassa largamente» o número previsto no contrato de serviço público, segundo o dirigente.
Tanto o presidente do NERBA como o autarca de Bragança consideram que «se o serviço for regular a procura, que já é significativa, aumentará».
Segundo dados da divisão de transportes da Câmara de Bragança, em 2007 embarcaram e desembarcaram, nesta cidade, 4400 passageiros.
Os passageiros de Bragança foram suficientes para, estatisticamente, garantirem um avião por dia quase lotado, tendo em conta que o aparelho ao serviço nesta carreira tem 18 lugares e faz dois voos diários em cada sentido, de segunda a sexta.
Em Vila Real embarcaram mais de 2700 pessoas, segundo dados obtidos pela Lusa junto do aeródromo local.
O número é inferior às quatro mil apontadas num estudo de 2002, mas dados dos últimos anos da Aerocondor revelam que a maior procura deste carreira aérea é em Vila Real.
A falta de condições no aeródromo local tem condicionado a ligação, nomeadamente em termos de horários e dimensão da aeronave.
O Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC) concluiu no início de Março o processo de certificação do aeródromo de Vila Real, a que se seguirá a remodelação e ampliação.
A autarquia prevê investir, numa primeira fase, cerca de um milhão de euros, para a pintura da pista, reparação do edifício da torre, parque de estacionamento, vedação anti-vandalismo de toda a área do aeródromo e na conclusão o projecto para a requalificação do edifício.
Depois de concluídas as negociações com os proprietários dos terrenos adjacentes, serão também efectuadas as obras de ampliação da pista de 950 para cerca de 1800 metros, para que, em 2011, seja possível a aterragem de aviões com 50 ou 100 lugares.
A infra-estrutura ficará também com condições de operacionalidade nocturna, que já existem em Bragança, onde o aeródromo com uma pista maior, de 1700 metros, está a ser alvo de um estudo de ampliação para cativar voos low-cost para vários destinos europeus.
A Lusa tentou obter esclarecimentos junto da Aerocondor e do Ministério dos Transportes, ainda sem resposta.