As Minas da Borralha, Montalegre, guardam a história de uma aldeia que nasceu e cresceu com a exploração de volfrâmio, que chegou a mobilizar 2.000 trabalhadores e deixou memórias de um trabalho difícil a 210 metros de profundidade.

A exploração mineira começou depois de um engenheiro francês ter registado a concessão em 1902. Com o fecho definitivo das minas, em 1986, a localidade da Freguesia de Salto esvaziou-se de gente e o património ficou abandonado até começar a ser recuperado pela Câmara de Montalegre que, em 2015, abriu um centro interpretativo.

António Fernandes, 78 anos, foi trabalhar para as Minas da Borralha quando regressou do Ultramar. Não havia, na altura, alternativas de emprego e por ali ficou durante 20 anos, até ao encerramento.

Foi escombreiro, maquinista, entivador (colocava madeiras para escoramento em minas) e depois passou a capataz. Vivia em Salto e inicialmente ia a pé até às minas, onde descia até às entranhas da terra para trabalhar. A descida era feita por “escadas e escadas e escadas”. Mais tarde foram colocados elevadores.

“Era muito difícil. Alguns só lá iam um dia e não voltavam”, afirmou à agência Lusa.

Já em pequeno andava pela zona das minas a apanhar pedras das sobras para vender e sobreviver. “A Guarda andava em cima de nós, mas nós fugíamos mais do que eles”, recordou.

António Fernandes referiu que ainda sabe “onde está o minério” e que “aquele alto todo está por explorar”.

Mário Mendes, 80 anos, nasceu na Borralha e deixou nas minas 25 anos de trabalho como eletricista. Foi sindicalista e hoje é presidente da Associação Social e Cultural dos Amigos da Borralha.

Recorda também o trabalho difícil a grande profundidade, a descida íngreme pelas escadas e o encerramento que já se antevia por anos de má gestão e a queda da cotação do volfrâmio. “Saímos todos para a rua sem indemnizações”, salientou.

Depois foi “uma tristeza”.

“Quando começa a decadência, a sair hoje um, amanhã outro e ainda hoje isso se reflete”, salientou.

Alberto Fernandes, presidente da Junta de Salto, referiu que a aldeia “morreu” com o fecho das minas. “Os novos que podiam trabalhar emigraram e restaram aqui os idosos e algumas crianças”, salientou.

Mário Mendes falava à Lusa junto ao Centro Interpretativo das Minas da Borralha, que conta a história desta localidade. “Aqui não havia absolutamente nada. Isto desenvolveu-se com pessoal vindo de todo o lado”, frisou.

A todos era oferecida casa, água e energia elétrica. Havia GNR, Correios, posto médico, refeitório, um cinema e a escola (década de 50), a primeira entre Braga e Chaves e onde alunos aprendiam uma profissão para os diversos trabalhos na mina.

Na aldeia industrial foram construídas lavarias, uma fundição única na Península Ibérica e onde se fazia a transformação do volfrâmio no ferro tungsténio, para além oficinas, armazéns, carpintaria, britadores, o ‘stockwerk’ e bairros que chegaram a albergar cerca de 5.000 pessoas. Atualmente, tem cerca de 170 moradores.

“À volta das minas nasceu uma aldeia com tudo. Era um oásis no concelho, era a aldeia mais desenvolvida da região, era procurada por muitos trabalhadores e famílias que viviam com dificuldade”, salientou Alberto Fernandes.

O nome da localidade teve origem em Domingos Borralha que, em 1900, foi trabalhar para as minas de Coelhoso (Bragança) onde comentou junto de um engenheiro francês que, no lugar onde vivia, existiam muitas pedras iguais às que ali eram exploradas e que as usavam para atirar às cabras e construir muros.

O francês foi confirmar e registou a concessão em 1902. “No primeiro ano, só à superfície, a Borralha, rendeu 70 toneladas de volfrâmio, No ano a seguir, já com algumas perfurações, 170 e assim começou a história da Borralha que, em 1904, já tinha luz elétrica” contou José Alves, do centro interpretativo.

O auge da exploração foi nas décadas de 30, 40, 50 do século passado, na altura da II Guerra Mundial e da Guerra da Coreia. O couto mineiro tinha 2.000 hectares e o volfrâmio era usado para o revestimento de armamento, encontrando-se ainda em peças de automóveis e nos filamentos das lâmpadas.

“Nos anos 40 um quilo de volfrâmio chegou a valer mil escudos (cinco euros) e os farristas davam-se ao luxo de fumar notas de 500. Um quilo de volfrâmio é uma pedra muito pequena”, referiu José Alves.

Para além dos mineiros, à volta das minas havia ainda os apanhistas que tinham uma licença especial da empresa e podiam explorar o volfrâmio sempre a céu aberto com a condição de, no final do dia vender tudo à companhia, e os farristas que eram contrabandistas.

As minas tiveram dois períodos de paragem (1944/46 e 1958/62).

Depois de anos de abandono, a Câmara de Montalegre deu início à recuperação do património das Minas da Borralha, onde já investiu mais de dois milhões de euros.

O projeto de musealização prevê ainda a recuperação da fundição, dos escritórios, pensão (refeitório) dos compressores e da entrada de para uma galeria

No verão de 2020, o centro interpretativo recebeu 2.855 visitantes.

A atividade mineira poderá ser agora retomada na Borralha, através de um projeto da empresa Minerália.

 

Minerália quer retomar extração de volfrâmio nas Minas da Borralha em Montalegre

 

A Minerália quer reaproveitar área da antiga mina da Borralha, Montalegre, para a extração de volfrâmio no âmbito de um projeto que “almeja a sustentabilidade”, prevê investir mais de 10 milhões de euros e criar 50 empregos diretos.

“Um setor mineiro desenvolvido modernamente pode e deve ser um dos motores do desenvolvimento do nosso Interior”, afirmou Adriano Barros, gerente da Minerália – Minas, Geotecnia e Construções, Lda., à agência Lusa, numa entrevista concedida por escrito.

A empresa requereu à Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) a celebração do contrato de concessão para a exploração de volfrâmio, estanho e molibdénio, que abrange área das Minas da Borralha, uma aldeia da freguesia de Salto, concelho de Montalegre, distrito de Vila Real.

A futura exploração será desenvolvida em parte da área da brecha de Santa Helena, uma das várias do antigo couto mineiro da localidade que nasceu e cresceu com a extração de volfrâmio. A mina funcionou entre 1902 e 1986.

Adriano Barros referiu que o projeto da “Borralha” prevê um investimento entre os 10 a 12 milhões de euros e a criação de cerca de 50 postos de trabalho diretos.

O investimento inclui o plano de compensações, “que começará mal o contrato seja celebrado”.

Adriano Barros prefere falar em “reaproveitamento” da área do antigo e histórico couto mineiro e aponta um projeto com uma “dimensão mais modesta” e que “almeja atingir a sustentabilidade”.

Disse ainda que a “índole da eventual exploração será a céu aberto”, mas com “as respetivas condicionantes ainda a serem estabelecidas em âmbito de Estudo de Impacte Ambiental (EIA) e plano de lavra”.

“Por força do natural desenvolvimento do conhecimento e as imposições ambientais e de segurança, a exploração e o tratamento de minérios sofreu também uma evolução crucial”, salientou.

O responsável apontou “as medidas ambientais preventivas, caucionárias e compensatórias que fazem parte da instrumentalização legal para a aprovação de um EIA”.

“Hoje em dia, no que toca à extração mineira há um especial cuidado com a proteção das populações e ambiente locais no que toca a poeiras, ruídos, linhas de água, entre outros fatores, assim como a segurança”, sublinhou.

Como exemplo, salientou que “devido às condições geológicas da área de exploração, prevê-se a utilização muito reduzida de explosivos e, mesmo esses, são de natureza bem diferente dos usados historicamente”.

Questionado sobre o porquê da aposta na Borralha, Adriano Barros contextualizou com o “reaparecimento do tungsténio como metal crítico para a Europa, consequência da sua aplicabilidade em sistemas de alta tecnologia e ferramentas, para além do histórico uso bélico, a perda de alguma competitividade da produção chinesa e o interesse ocidental da não dependência de metais críticos”.

Após o fim da guerra entre as Coreias, o preço do tungsténio desceu significativamente e as minas portuguesas foram encerrando até aos anos 80.

“A prospeção realizada na Borralha, pela Minerália, obliterou muitas áreas que, no nosso ponto de vista, não são económicas à luz da atualidade e realçou o potencial da brecha de Santa Helena onde focamos mais os nossos trabalhos”, frisou.

Adriano Barros entende que este projeto “pode ser um importante vetor de desenvolvimento local e regional e um exemplo de que é possível a existência de atividade mineira responsável e sustentável”.

Adiantou que o “minério extraído será tratado no local, de forma a criar concentrados economicamente vendáveis” e que a “dimensão prevista não justifica o investimento na refinação dos concentrados obtidos, por via de fundição, como se fazia, historicamente, na Borralha”.

“Uma das características que mais nos agrada na mineralização da brecha de Santa Helena é a presença vestigial a nula de sulfuretos. A concentração da volframite (mineral que contém o tungsténio), por via da sua elevada densidade será feita utilizando métodos hidrogravíticos em circuitos fechados, com o reaproveitamento e recirculação de águas e sem o uso de químicos”, salientou.

Acrescentou que “os estudos metalúrgicos que têm sido desenvolvidos apontam para esta possibilidade que é a ideal sob o ponto de vista ambiental - a produção de concentrados de volframite utilizando apenas métodos físicos (gravíticos)”.

“Todos os processos até à aprovação do EIA e do plano de lavra poderão levar mais ou menos dois anos após a celebração do contrato de concessão mineira com a DGEG”, referiu.

Associações e movimentos antiminas e alguns moradores contestam a reativação da exploração mineira na Borralha e alertam para os impactos ambientais, na saúde e na agricultura.

 

Pode saber mais no Blog Blog Chaves: "Olhar sobre o "Reino maravilhoso" https://chaves.blogs.sapo.pt/o-barroso-aqui-tao-perto-borralha-1959148

Algumas fotos de Fernando DC Ribeiro Blog Chaves, a quem agradecemos.



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