Produtores da serra do Alvão, Vila Real, pedem uma reavaliação das áreas baldias excluídas dos apoios, mas que diariamente são pastadas por vacas e cabras como revelam os dados das coleiras GPS que trazem ao pescoço.

Pelo Alvão cruzam-se cabras bravias e vacas maronesas. Fazem um pastoreio livre, escolhem por onde querem ir e procuram alimento em lameiros, locais rochosos, entre árvores ou junto aos aerogeradores que se espalham pela serra. Diariamente percorrem terreno baldio.

“Estas raças autóctones estão perfeitamente adaptadas a estes terrenos acidentados”, afirmou à agência Lusa Avelino Rego, produtor de Alvadia, Ribeira de Pena, com 40 vacas maronesas.

Avelino mostrou-se preocupado com os cortes das áreas baldias elegíveis para apoios no âmbito da Política Agrícola Comum (PAC), e concretizou: -“Perdemos uma grande parte do nosso rendimento”.

Rendimento que advém, explicou, da venda de carne e dos subsídios.

O produtor explicou que o baldio tem uma função preponderante na viabilidade das explorações de criação de gado em regime extensivo e que a sua elegibilidade nos programas de apoio, nomeadamente a PAC, tem vindo “a ser desconsiderada”, quer pelo coeficiente de 50% na elegibilidade, isto é, por cada hectare declarado só é pago metade, quer pela exclusão das áreas menos produtivas e ainda exclusão cega das áreas arborizadas.

Luís Ribeiro, de Gouvães da Serra, Vila Pouca de Aguiar, percorre a montanha de moto à procura do rebanho de 300 cabras bravias. É hora de almoço e de as ajudar a procurar água.

No seu caso, disse que deixou de receber “cinco e seis mil euros” de apoios por ano. “Tinha 23 hectares e agora deram-me oito”, apontou, referindo que “tira pouco rendimento”, que atualmente ganha “para a gasolina e mal” e que tem de trabalhar em outras atividades.

As cabras, que encontrou facilmente devido à coleira GPS que uma delas traz ao pescoço, comiam numa área com árvores e rochas não elegível pelo Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas (IFAP), do Ministério da Agricultura.

“Elas gostam mais de andar onde têm pedras”, contou, admitindo ponderar acabar com o rebanho.

António José, de Lamas, Ribeira de Pena, também subiu a serra de moto em busca das suas 200 cabras bravias e também disse ter sido afetado pelos cortes. “Vou perder para aí sete a oito mil euros”, contabilizou.

A sua mulher queria instalar-se com um rebanho de 150 cabras, mas já não havia baldio disponível e a exploração acabou apenas com 70. “Não nos deixam crescer na atividade, cortam-nos logo as pernas”, lamentou.

Os pagamentos aos produtores resultam de candidaturas a várias medidas complementares, algumas em função do número de animais outras da área candidata.

Olhando para as cabras a saltitar entre pedras, Duarte Marques, do projeto Terra Maronesa, ironizou: “As cabras e as vacas do Alvão não respeitam a elegibilidade e a ilegibilidade ditadas pelo IFAP, elas pastoreiam em áreas não elegíveis, ou seja, não respeitam as orientações que são dadas administrativamente pelas entidades”.

No âmbito daquele projeto foram distribuídas pelos produtores coleiras com um sistema GPS que permite monitorizar a movimentação dos animais pelo Alvão.

São já dois anos de dados que, segundo Duarte Marques, “permitem demonstrar que aquelas áreas, mesmo as ilegíveis, são pastoreadas”.

O responsável realçou o papel desempenhado pelos rebanhos no controlo da vegetação e prevenção de incêndios e disse temer, com a redução do rendimento, um maior abandono da atividade.

“Com menos animais a montanha não é utilizada (…) Estamos a criar condições para que haja incêndios com maior densidade, mais área ardida e mais destruição da montanha”, referiu.

Num outro ponto da serra, Avelino Rego apontou para uma área contínua de 90 hectares considerada improdutiva e perguntou ao investigador do Instituto Poligénico de Bragança (IPB): “Este terreno não tem pastagem?”.

Prontamente Carlos Aguiar respondeu que sim, "tem muita pastagem". “É um erro crasso a exclusão destas áreas [com afloramento rochoso] porque elas são fundamentais e porque elas produzem”, frisou o investigador.

Os produtores do Alvão reclamam uma reversão das regras e queixam-se da burocracia nos pedidos de reavaliações, tendo de fotografar todas as áreas em causa.

“É inviável fazermos esse pedido de reclassificação porque o terreno é imenso”, referiu Avelino Rego, acrescentando que a decisão do IFAP é feita administrativamente com base em fotografias aéreas.

Joana Nogueira, professora no Instituto Politécnico de Viana do Castelo, defendeu que devem ser desenhadas soluções mais adaptadas aos territórios serranos e que é preciso mais diálogo entre o Ministério da Agricultura e quem está no terreno.

A investigadora mostrou-se preocupada porque “há muita gente a considerar a hipótese de desistir da atividade” o que poderá intensificar o despovoamento do Interior.

*** Paula Lima, da agência Lusa *** Fotos: Avelino Rego




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